Estão aí os jogos olímpicos e como sempre os nossos atletas geram as mais diversas reacções. Uns insultam-nos sempre que não ganham medalhas, dizendo que o país está a investir neles e que era devido algum retorno. Para outros são heróis independentemente dos resultados, sob o pretexto de que para um país pequenino como o nosso alcançar o top 100 já é um feito. Estes bitates de treinador de bancada já nos são conhecidos, sendo tipicamente Portugueses e surgindo em muitas outras situações. O que me pareceu mais digno de comentário foram as vozes que aproveitaram o evento para chamar a atenção para a falta de apoios que os atletas sofrem neste país.
É certo e sabido que, em Portugal, quando se fala de desporto fala-se quase exclusivamente de futebol. Daí que seja muitas vezes criticada a falta de apoios incidentes sobre as restantes modalidades. Estes apoios podem surgir tanto sob forma financeira como da existência de espaços de treino adequados e, ainda, de outros benefícios como o ajuste de planos curriculares para os estudantes.
Quanto aos que envolvem dinheiro parece-me que a situação é clara e recorrente: investe-se naquilo que tem mais projecção diante do grande público e, portanto, maiores possibilidades de retorno (não só financeiro). Está errado? Talvez. É diferente lá fora? Não teria tanta certeza. Cada nação tem as suas modalidades predilectas, e claro que um país maior tem provavelmente audiência para um maior número delas. É argumentável que, com campanhas de marketing adequadas, se poderia aumentar a popularidade de outras modalidades. Mas seria sempre um processo lento, demorando gerações até surtir efeitos visíveis. Seria também eticamente dúbio, já que seria uma interferência consciente e propositada do Estado na mentalidade do seu povo, um pouco ao sabor dos romances de Orson Wells.
De resto é certo que se poderia facilitar a vida aos atletas de outro modo. Mas aqui percorre-se terreno pantanoso, que tem de ser trilhado com cuidado. Não creio que devamos seguir o exemplo dos (tantas vezes aclamados) Estados Unidos, cujas Universidades praticamente recrutam os estudantes atletas, atribuindo-lhes uma licenciatura aleatória para justificar a sua presença. Estranho que ninguém ache isso perturbante na Europa.
Outro aspecto muito importante que não pode ser esquecido é a idade dos atletas a auxiliar. Durante uma das provas de natação no passado Sábado o comentador sugeriu que se aliviasse a carga horária do plano curricular dos atletas de competição em idade escolar. Isto porque treinando bi-diariamente torna-se incomportável para estas crianças conciliar o desporto com a escola. Apesar de fazer sentido, não pude deixar de ficar de pé atrás quando referiu estarmos a falar de crianças de 12 anos. Afinal, será uma criança dessa tenra idade realmente capaz de tomar uma decisão dessas? E se não, devemos deixar os papás orgulhosos que aspiram a exibir o seu vitorioso filho aos vizinhos decidirem por ele? É certo que, ao não permitir esse treino intensivo precoce, lhe estamos de certo modo a roubar a oportunidade de competir com atletas estrangeiros que o tiveram. E qualquer género de uniformização imposta (ex: limites de tempo de treino consoante a idade) seria impraticável, para além de algo totalitarista. É, de facto, uma questão bicuda. Por vezes, há falta de outra solução, o melhor é mesmo seguir com a maioria...
Filipe Baptista de Morais
segunda-feira, 30 de julho de 2012
sábado, 21 de julho de 2012
Caixinha de Surpresas
É muitas vezes referido que uma das coisas que diferencia um ser humano de uma máquina é a sua capacidade de surpreender e ser surpreendido. Não há dúvida de que a vida seria muito mais aborrecida se não estivesse repleta de outras pessoas com essa habilidade de nos surpreender constantemente. Mas e quando as surpresas não são boas quanto isso? Essa impossibilidade de caracterizar e prever o comportamento dos outros tem tanto de fantástico como de assustador.
É verdade que não haveria grande proveito em ter amigos se fossemos perfeitamente capazes de prever o seu comportamento, perdendo assim aquilo que nos maravilha ou diverte. Mas a amizade, assim como as relações inter-pessoais no geral, baseia-se na confiança que por sua vez deriva da nossa crença em que certas pessoas nunca farão isto ou aquilo. Perceber que essa crença é fracamente fundamente e que nos é requerida uma confiança cega pode ser aterrorizante. Ainda que não acreditemos nisto, ainda teríamos que responder à pergunta: quanto tempo leva a conhecer uma pessoa? Uma semana, um ano, uma década, uma vida? à medida que nos vamos aproximando da realidade começamos a assemelhar-nos àqueles que fazem prognósticos no final dos jogos de futebol.
Para complicar ainda mais a questão é certo e sabido que as pessoas podem mudar. Bom, talvez seja mais consensual dizer que há quem acredite nisso. Isto leva a que, mesmo que tenhamos absoluta confiança na nossa capacidade de análise, temos de estar sempre preparados para todo o tipo de surpresas. Levanta ainda uma questão interessante; quando os actos de uma pessoa não encaixam na ideia que tínhamos dela, será que foi mesmo por ter mudado? E se não, há quanto tempo estamos enganados a seu respeito?
Filipe Baptista de Morais
É verdade que não haveria grande proveito em ter amigos se fossemos perfeitamente capazes de prever o seu comportamento, perdendo assim aquilo que nos maravilha ou diverte. Mas a amizade, assim como as relações inter-pessoais no geral, baseia-se na confiança que por sua vez deriva da nossa crença em que certas pessoas nunca farão isto ou aquilo. Perceber que essa crença é fracamente fundamente e que nos é requerida uma confiança cega pode ser aterrorizante. Ainda que não acreditemos nisto, ainda teríamos que responder à pergunta: quanto tempo leva a conhecer uma pessoa? Uma semana, um ano, uma década, uma vida? à medida que nos vamos aproximando da realidade começamos a assemelhar-nos àqueles que fazem prognósticos no final dos jogos de futebol.
Para complicar ainda mais a questão é certo e sabido que as pessoas podem mudar. Bom, talvez seja mais consensual dizer que há quem acredite nisso. Isto leva a que, mesmo que tenhamos absoluta confiança na nossa capacidade de análise, temos de estar sempre preparados para todo o tipo de surpresas. Levanta ainda uma questão interessante; quando os actos de uma pessoa não encaixam na ideia que tínhamos dela, será que foi mesmo por ter mudado? E se não, há quanto tempo estamos enganados a seu respeito?
Filipe Baptista de Morais
quarta-feira, 11 de julho de 2012
Política não é futebol
Acabei há pouco tempo de ler "A Dividadura" de Francisco Louçã e Mariana Mortágua. O primeiro todos conhecem, líder do Bloco de Esquerda cujas ideologias políticas sinceramente não costumo partilhar. Já a segunda apenas tinha ouvido referir uma ou outra vez, mas dada a sua juventude creio que deve ser extremamente competente visto que o Louçã, goste-se ou não das suas ideias, não me parece ser o tipo de pessoa que valorize uma cara bonita acima do trabalho de qualidade. Apesar de ela a ter.
Em primeiro lugar gostaria de justificar as minhas leituras, visto que não sendo simpatizante do BE podem parecer um pouco estranhas. Acontece que para mim a Política não é como o futebol, em que escolhemos um clube (ou alguém o escolhe por nós) e mantemo-nos cegamente fiéis a ele sem nenhuma razão em particular para tal. Não, na Política devemos tentar manter uma postura aberta e, acima de tudo, informada. Assim sendo faz todo o sentido escutarmos as opiniões adversas, assim como aquilo que as motiva. A Política tem ainda outra grande diferença em relação ao futebol; neste, quando nos enganamos, apenas perdemos aquela imperial que apostámos lá no bar, enquanto que ao enganarmo-nos na Política nos arriscamos a perder o subsídio de férias.
Falando agora um pouco do livro em concreto, penso que devo apontar algumas coisas de que não gostei. Em primeiro lugar o título, que acho algo demagógico. Mas, mais uma vez, numa época em que cada vez mais são rostos e palavras bonitas que ganham eleições penso que é legítimo perdoar esses pormenores. Em seguida e também por último, não gostei da extensa introdução sobre o modo como os reis de não sei onde cancelavam as dívidas de 7 em 7 anos ou como a Bíblia proibia os juros. Achei desnecessário, demagógico e até algo insano; aflige-me particularmente quando se referenciam livros religiosos em discussões políticas. Após este conturbado início, contudo, o livro apresenta uma clara e lúcida reflexão sobre a crise Europeia, tanto a nível das causas como dos efeitos e possíveis desenlaces. Podia tentar transmitir algum do conhecimento dos autores aqui, mas provavelmente iria sair uma interpretação imprecisa (quiçá idiótica) pelo que me limito a recomendar veementemente a obra.
Volto agora ao 2º parágrafo, que a meu ver roçou uma distinção muito importante. Embora parece relativamente óbvia a distinção entre um partido político e um clube de futebol a verdade é que muita gente parece confundi-los. Se perguntarem a uma pessoa na rua a sua orientação política muito provavelmente ouvirão algo como "sou socialista", "sou do CDS", ou simplesmente "sou de Esquerda". É de notar, em primeira instância, o uso constante do termo "Sou", que revela uma certa invariância ou compromisso absoluto. Também é interessante notar que, embora ninguém tenha perguntado em quem votaram nas últimas eleições ou sequer feito alguma referência a partidos políticas a resposta inclui muitas vezes uma destas entidades. Depois claro que ninguém nos responde com as medidas que acha adequadas para o País, até porque poucos são os que têm uma opinião formada (se é ou não [bem] fundamente é toda uma outra questão) a esse respeito. Verdade seja dita, não temos tempo nem conhecimento nem obrigação de fazer o nosso próprio orçamento de Estado e afins. Por isso é que cada vez mais a Democracia nos leva a votar não em políticas, ideias ou ideais mas sim em simples nomes, que parecem representar alguma entidade abstracta que alguém disse ser porreira. E assim vota-se como quem escolhe um clube de futebol; porque sim. Ou porque o primo diz que sim.
É certamente muito estranho que a maioria dos Portugueses desconheça quase por completo as propostas daqueles em quem votam. Principalmente as pessoas a partir de uma certa idade, que até parecem ficar ofendidas se alguém achar que deveriam ser capazes de justificar as suas opções políticas. Isto é preocupante, deixando a dúvida: como são realmente escolhidos os nossos governantes?
Filipe Baptista de Morais
Em primeiro lugar gostaria de justificar as minhas leituras, visto que não sendo simpatizante do BE podem parecer um pouco estranhas. Acontece que para mim a Política não é como o futebol, em que escolhemos um clube (ou alguém o escolhe por nós) e mantemo-nos cegamente fiéis a ele sem nenhuma razão em particular para tal. Não, na Política devemos tentar manter uma postura aberta e, acima de tudo, informada. Assim sendo faz todo o sentido escutarmos as opiniões adversas, assim como aquilo que as motiva. A Política tem ainda outra grande diferença em relação ao futebol; neste, quando nos enganamos, apenas perdemos aquela imperial que apostámos lá no bar, enquanto que ao enganarmo-nos na Política nos arriscamos a perder o subsídio de férias.
Falando agora um pouco do livro em concreto, penso que devo apontar algumas coisas de que não gostei. Em primeiro lugar o título, que acho algo demagógico. Mas, mais uma vez, numa época em que cada vez mais são rostos e palavras bonitas que ganham eleições penso que é legítimo perdoar esses pormenores. Em seguida e também por último, não gostei da extensa introdução sobre o modo como os reis de não sei onde cancelavam as dívidas de 7 em 7 anos ou como a Bíblia proibia os juros. Achei desnecessário, demagógico e até algo insano; aflige-me particularmente quando se referenciam livros religiosos em discussões políticas. Após este conturbado início, contudo, o livro apresenta uma clara e lúcida reflexão sobre a crise Europeia, tanto a nível das causas como dos efeitos e possíveis desenlaces. Podia tentar transmitir algum do conhecimento dos autores aqui, mas provavelmente iria sair uma interpretação imprecisa (quiçá idiótica) pelo que me limito a recomendar veementemente a obra.
Volto agora ao 2º parágrafo, que a meu ver roçou uma distinção muito importante. Embora parece relativamente óbvia a distinção entre um partido político e um clube de futebol a verdade é que muita gente parece confundi-los. Se perguntarem a uma pessoa na rua a sua orientação política muito provavelmente ouvirão algo como "sou socialista", "sou do CDS", ou simplesmente "sou de Esquerda". É de notar, em primeira instância, o uso constante do termo "Sou", que revela uma certa invariância ou compromisso absoluto. Também é interessante notar que, embora ninguém tenha perguntado em quem votaram nas últimas eleições ou sequer feito alguma referência a partidos políticas a resposta inclui muitas vezes uma destas entidades. Depois claro que ninguém nos responde com as medidas que acha adequadas para o País, até porque poucos são os que têm uma opinião formada (se é ou não [bem] fundamente é toda uma outra questão) a esse respeito. Verdade seja dita, não temos tempo nem conhecimento nem obrigação de fazer o nosso próprio orçamento de Estado e afins. Por isso é que cada vez mais a Democracia nos leva a votar não em políticas, ideias ou ideais mas sim em simples nomes, que parecem representar alguma entidade abstracta que alguém disse ser porreira. E assim vota-se como quem escolhe um clube de futebol; porque sim. Ou porque o primo diz que sim.
É certamente muito estranho que a maioria dos Portugueses desconheça quase por completo as propostas daqueles em quem votam. Principalmente as pessoas a partir de uma certa idade, que até parecem ficar ofendidas se alguém achar que deveriam ser capazes de justificar as suas opções políticas. Isto é preocupante, deixando a dúvida: como são realmente escolhidos os nossos governantes?
Filipe Baptista de Morais
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