sábado, 25 de outubro de 2014

Plasticidade da Igreja

Hoje cruzei-me com um texto muito interessante sobre as pressões existentes "para fazer coincidir igreja e sociedade", cuja leitora recomendo já que me revejo na maior parte das ideias aí expostas. De facto, é impossível ignorar toda a evolução da igreja católica ao longo de mais de dois milhares de anos; evolução essa que foi sem dúvida essencial para que esta se mantenha como uma das principais referências religiosas do século XXI a nível mundial.

A palavra evolução encontra-se destacada pois de facto é dessa forma que a Igreja (e os próprios fiéis) geralmente justificiam alterações (drásticas, por vezes) nos comportamentos condenados, aceites ou recomendados por esta. Assim como nos comportamentos que esta adopta. E, após cada evolução, parece que a Igreja se encontra mais iluminada, que aquilo que defendeu durante vários séculos estava obviamente errado e que, agora que o conseguem ver, isso é claro como água.

A realidade, contudo, é outra. A Igreja simplesmente adapta as suas crenças quando estas entram em conflito demasiado vincado com a sociedade, de modo a não perder com o contacto com esta. Mas os livros religiosas em que estas se baseiam continuam a ser os mesmos. As suas palavras não mudaram. Serão as escrituras tão impenetráveis que, passadas largas centenas de anos, continuemos a re-interpretá-las radicalmente? Claro que não. A realidade é que já pouco delas se aproveita na Igreja de hoje em dia, e menos ainda se aproveitará na do futuro. As passagens indesejáveis (por vezes até contraditórias com outras passagens) são rapidamente qualificadas de metafóricas, e re-interpretas de formas que muitas vezes roçam o ridículo. Por vezes, parece que as pessoas pensam que a metáfora é uma figura de estilo que consiste em dizer algo quando na realidade se pretende dizer o oposto. Hint: não é.

Um comentário qualquer a uma notícia do jornal online observador previa que em 2100 as únicas organizações ainda existentes seriam a Igreja Católica e o PCP, por serem as únicas que se mantêm fiéis aos seus ideais. É possível, de facto, defender que a Igreja sempre se manteve fiel aos seus ideais. Mas apenas tendo em conta que os alterou sempre que conveniente ou necessário. É muito provável que a Igreja Católica ainda exista (e de forma expressiva) em 2100, sim, mas precisamente pelo motivo oposto. O que a torna uma organização tão resistente ao passar dos anos é precisamente a forma como consegue ir descartando as crenças e idealogias quando estas passam a ser consideradas obsoletas. Na realidade, não se deveria dizer que a Igreja Católica tem centenas de anos, já que a Igreja que conhecemos muito pouco terá em comum com a sua progenitora.

Também interessante no mesmo texto é a referência ao esforço da parte da sociedade de incluir a Igreja. De facto, parece-me que a Igreja usufruiu do mesmo estatuto bonificado de certos bancos: é demasiado grande para falhar.