domingo, 28 de setembro de 2014

Transparência nas Greves

Na quinta-feira passada teve lugar mais uma greve dos trabalhadores do metro de Lisboa, esta total (24h). Diho mais uma porque entre greves totais, parciais e plenários dos trabalhadores deve ser raro o mês em que não haja falhas.

A greve deveu-se, obviamente, a questões salariais e de condições de trabalho. Não vou aqui discutir ou analisar a  sua legitimidade. Vou antes criticar a forma como trabalhadores, sindicatos e jornalistas tentaram encobrir essas motivações, substituindo-as por outras mais nobres.

Uma das razões invocadas oficialmente é a de reivindicar um "investimento que permita a reposição de um serviço com a qualidade e a segurança a que os utentes têm direito". Parece bonito. Mas não será essa uma luta dos utentes, ou dos cidadãos em geral, e não dos trabalhadores? A tentativa de tentar mascarar a greve como uma acção pró-utente revela-se patética a qualquer pessoa que se dê ao trabalho de perguntar a opinião a um utente.

Outro dos motivos invocados é o facto de os trabalhadores e sindicatos não concordarem com a eventual privatização do metro de Lisboa. Mas, que eu sabia, nenhum deles exerce qualquer cargo executivo na empresa. Pode não ser intuitivo, mas eles têm tanto direito a opinar sobre e influenciar essa decisão como eu; isto é, quando o fazem fazem-no enquanto cidadãos a criticar a gestão de uma empresa pública e não enquanto trabalhadores da mesma. Seria equivalente a fazerem greve devido ao elevado valor das taxas moderadores no SNS, ou ao aumento do IVA da restauração. Não faz sentido. Similarmente à motivação anterior esta luta, a existir, é uma luta dos cidadãos em geral e a realizar com os meios ao seu dispôr (protestos, manifestações, urnas, etc...).

Há que respeitar o protesto (cuja forma está consagrada na lei), dos trabalhadores. Mas façam-no de forma aberta e transparente, não inventando motivos rebuscados para dizerem que estão a defender os direitos de outrem.


Filipe Baptista de Morais

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Justiça Suspensa

A ex-ministra da educação Maria de Lurdes Rodrigues foi hoje condenada a três anos e seis meses de prisão, com pena suspensa. Certamente serão muitas as vozes que se revoltarão, dizendo que mais uma vez o poder ou as influências políticas safaram alguém de cumprir pena pelos seus crimes. Mas, vendo bem, o que não falta por aí são penas suspensas (outra, outra, ainda outra e uma notícia sobre o assunto), e parece-me que tão depressa são atribuídas a ex-ministros como ao Zé Povinho. O que não significa que não seja digno de indignação.

Afinal, qual a justificação para uma pena suspensa? A meu ver, esta seria apenas adequada a delitos considerados não graves, sendo uma espécie de segunda oportunidade concedida a um cidadão cumpridor que cometeu um pequeno deslize. Mas o caso que referi acima (assim como muitos outros) é de um crime que o tribunal considerou suficientemente grave para merecer vários anos de prisão. Anos. Um ano na prisão é, parece-me, um castigo bastante duro e não me parece de todo que encaixe nos candidados a pena suspensa que pintei acima.

Parece-me, sim, que as penas suspensas têm sido incentivadas por razões orçamentais, tanto por falta de espaço nas prisões como pelos custos associados à manutenção dos reclusos.

Na Justiça, como em tudo (mesmo na Saúde por muito que nos custe considerá-lo e admiti-lo) as questões orçamentais, que é como quem diz o custo do Sistema, não podem ser ignoradas. Contudo, a solução passa pela re-estruturação e, eventualmente, pela reconcepção do Sistema. Nunca pela perversão de alguns dos seus mecanismos de triagem/avaliação, dando a entender que estes são função do resultado desejado, e não vice-versa como deveria ser.


Filipe Baptista de Morais