segunda-feira, 30 de julho de 2012

Mais rápido, mais alto, mais forte

Estão aí os jogos olímpicos e como sempre os nossos atletas geram as mais diversas reacções. Uns insultam-nos sempre que não ganham medalhas, dizendo que o país está a investir neles e que era devido algum retorno. Para outros são heróis independentemente dos resultados, sob o pretexto de que para um país pequenino como o nosso alcançar o top 100 já é um feito. Estes bitates de treinador de bancada já nos são conhecidos, sendo tipicamente Portugueses e surgindo em muitas outras situações. O que me pareceu mais digno de comentário foram as vozes que aproveitaram o evento para chamar a atenção para a falta de apoios que os atletas sofrem neste país.

É certo e sabido que, em Portugal, quando se fala de desporto fala-se quase exclusivamente de futebol. Daí que seja muitas vezes criticada a falta de apoios incidentes sobre as restantes modalidades. Estes apoios podem surgir tanto sob forma financeira como da existência de espaços de treino adequados e, ainda, de outros benefícios como o ajuste de planos curriculares para os estudantes.

Quanto aos que envolvem dinheiro parece-me que a situação é clara e recorrente: investe-se naquilo que tem mais projecção diante do grande público e, portanto, maiores possibilidades de retorno (não só financeiro). Está errado? Talvez. É diferente lá fora? Não teria tanta certeza. Cada nação tem as suas modalidades predilectas, e claro que um país maior tem provavelmente audiência para um maior número delas. É argumentável que, com campanhas de marketing adequadas, se poderia aumentar a popularidade de outras modalidades. Mas seria sempre um processo lento, demorando gerações até surtir efeitos visíveis. Seria também eticamente dúbio, já que seria uma interferência consciente e propositada do Estado na mentalidade do seu povo, um pouco ao sabor dos romances de Orson Wells.

De resto é certo que se poderia facilitar a vida aos atletas de outro modo. Mas aqui percorre-se terreno pantanoso, que tem de ser trilhado com cuidado. Não creio que devamos seguir o exemplo dos (tantas vezes aclamados) Estados Unidos, cujas Universidades praticamente recrutam os estudantes atletas, atribuindo-lhes uma licenciatura aleatória para justificar a sua presença. Estranho que ninguém ache isso perturbante na Europa.

Outro aspecto muito importante que não pode ser esquecido é a idade dos atletas a auxiliar. Durante uma das provas de natação no passado Sábado o comentador sugeriu que se aliviasse a carga horária do plano curricular dos atletas de competição em idade escolar. Isto porque treinando bi-diariamente torna-se incomportável para estas crianças conciliar o desporto com a escola. Apesar de fazer sentido, não pude deixar de ficar de pé atrás quando referiu estarmos a falar de crianças de 12 anos. Afinal, será uma criança dessa tenra idade realmente capaz de tomar uma decisão dessas? E se não, devemos deixar os papás orgulhosos que aspiram a exibir o seu vitorioso filho aos vizinhos decidirem por ele? É certo que, ao não permitir esse treino intensivo precoce, lhe estamos de certo modo a roubar a oportunidade de competir com atletas estrangeiros que o tiveram. E qualquer género de uniformização imposta (ex: limites de tempo de treino consoante a idade) seria impraticável, para além de algo totalitarista. É, de facto, uma questão bicuda. Por vezes, há falta de outra solução, o melhor é mesmo seguir com a maioria...


Filipe Baptista de Morais

sábado, 21 de julho de 2012

Caixinha de Surpresas

É muitas vezes referido que uma das coisas que diferencia um ser humano de uma máquina é a sua capacidade de surpreender e ser surpreendido. Não há dúvida de que a vida seria muito mais aborrecida se não estivesse repleta de outras pessoas com essa habilidade de nos surpreender constantemente. Mas e quando as surpresas não são boas quanto isso? Essa impossibilidade de caracterizar e prever o comportamento dos outros tem tanto de fantástico como de assustador.

É verdade que não haveria grande proveito em ter amigos se fossemos perfeitamente capazes de prever o seu comportamento, perdendo assim aquilo que nos maravilha ou diverte. Mas a amizade, assim como as relações inter-pessoais  no geral, baseia-se na confiança que por sua vez deriva da nossa crença em que certas pessoas nunca farão isto ou aquilo. Perceber que essa crença é fracamente fundamente e que nos é requerida uma confiança cega pode ser aterrorizante. Ainda que não acreditemos nisto, ainda teríamos que responder à pergunta: quanto tempo leva a conhecer uma pessoa? Uma semana, um ano, uma década, uma vida? à medida que nos vamos aproximando da realidade começamos a assemelhar-nos àqueles que fazem prognósticos no final dos jogos de futebol.

Para complicar ainda mais a questão é certo e sabido que as pessoas podem mudar. Bom, talvez seja mais consensual dizer que há quem acredite nisso. Isto leva a que, mesmo que tenhamos absoluta confiança na nossa capacidade de análise, temos de estar sempre preparados para todo o tipo de surpresas. Levanta ainda uma questão interessante; quando os actos de uma pessoa não encaixam na ideia que tínhamos dela, será que foi mesmo por ter mudado? E se não, há quanto tempo estamos enganados a seu respeito?


Filipe Baptista de Morais

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Política não é futebol

Acabei há pouco tempo de ler "A Dividadura" de Francisco Louçã e Mariana Mortágua. O primeiro todos conhecem, líder do Bloco de Esquerda cujas ideologias políticas sinceramente não costumo partilhar. Já a segunda apenas tinha ouvido referir uma ou outra vez, mas dada a sua juventude creio que deve ser extremamente competente visto que o Louçã, goste-se ou não das suas ideias, não me parece ser o tipo de pessoa que valorize uma cara bonita acima do trabalho de qualidade. Apesar de ela a ter.


Em primeiro lugar gostaria de justificar as minhas leituras, visto que não sendo simpatizante do BE podem parecer um pouco estranhas. Acontece que para mim a Política não é como o futebol, em que escolhemos um clube (ou alguém o escolhe por nós) e mantemo-nos cegamente fiéis a ele sem nenhuma razão em particular para tal. Não, na Política devemos tentar manter uma postura aberta e, acima de tudo, informada. Assim sendo faz todo o sentido escutarmos as opiniões adversas, assim como aquilo que as motiva. A Política tem ainda outra grande diferença em relação ao futebol; neste, quando nos enganamos, apenas perdemos aquela imperial que apostámos lá no bar, enquanto que ao enganarmo-nos na Política  nos arriscamos a perder o subsídio de férias.

Falando agora um pouco do livro em concreto, penso que devo apontar algumas coisas de que não gostei. Em primeiro lugar o título, que acho algo demagógico. Mas, mais uma vez, numa época em que cada vez mais são rostos e palavras bonitas que ganham eleições penso que é legítimo perdoar esses pormenores. Em seguida e também por último, não gostei da extensa introdução sobre o modo como os reis de não sei onde cancelavam as dívidas de 7 em 7 anos ou como a Bíblia proibia os juros. Achei desnecessário, demagógico e até algo insano; aflige-me particularmente quando se referenciam livros religiosos em discussões políticas. Após este conturbado início, contudo, o livro apresenta uma clara e lúcida reflexão sobre a crise Europeia, tanto a nível das causas como dos efeitos e possíveis desenlaces. Podia tentar transmitir algum do conhecimento dos autores aqui, mas provavelmente iria sair uma interpretação imprecisa (quiçá idiótica) pelo que me limito a recomendar veementemente a obra.

Volto agora ao 2º parágrafo, que a meu ver roçou uma distinção muito importante. Embora parece relativamente óbvia a distinção entre um partido político e um clube de futebol a verdade é que muita gente parece confundi-los. Se perguntarem a uma pessoa na rua a sua orientação política muito provavelmente ouvirão algo como "sou socialista", "sou do CDS", ou simplesmente "sou de Esquerda". É de notar, em primeira instância, o uso constante do termo "Sou", que revela uma certa invariância ou compromisso absoluto. Também é interessante notar que, embora ninguém tenha perguntado em quem votaram nas últimas eleições ou sequer feito alguma referência a partidos políticas a resposta inclui muitas vezes uma destas entidades. Depois claro que ninguém nos responde com as medidas que acha adequadas para o País, até porque poucos são os que têm uma opinião formada (se é ou não [bem] fundamente é toda uma outra questão) a esse respeito. Verdade seja dita, não temos tempo nem conhecimento nem obrigação de fazer o nosso próprio orçamento de Estado e afins. Por isso é que cada vez mais a Democracia nos leva a votar não em políticas, ideias ou ideais mas sim em simples nomes, que parecem representar alguma entidade abstracta que alguém disse ser porreira. E assim vota-se como quem escolhe um clube de futebol; porque sim. Ou porque o primo diz que sim.

É certamente muito estranho que a maioria dos Portugueses desconheça quase por completo as propostas daqueles em quem votam. Principalmente as pessoas a partir de uma certa idade, que até parecem ficar ofendidas se alguém achar que deveriam ser capazes de justificar as suas opções políticas. Isto é preocupante, deixando a dúvida: como são realmente escolhidos os nossos governantes?


Filipe Baptista de Morais