domingo, 7 de dezembro de 2014

O Irrelevante da Questão

A detenção de Sócrates colocou os meios de comunicação Portugueses alvoroço, tendo direito a presença diária nos jornais, seja em papel ou em formato electrónico ou televisivo. Aqui nada de estranho; trata-se, afinal, da detenção de um ex primeiro ministro por suspeitas de branqueamento de capitais, fraude fiscal e, a meu ver mais relevante para o interesse público, corrupção. É importante natural, e até de louvar, que a Imprensa tente chegar ao cerne da questão*.

Mas será isso que está a acontecer? Vou fazer um pequeno apanhado das "notícias" e factos interessantes com que me brindaram sobre o caso. A primeira refeição de Sócrates na prisão foi cozido à Portuguesa. A cela de Sócrates não tem água quente. A cela de Sócrates encontra-se no sector feminino da prisão. O actual namorado da ex-mulher levou-lhe um casaco, porque está frio. Isto tudo estaria muito bem se fosse relatado na Caras, ou se se tratasse de um qualquer jornal particularmente incompetente na avaliação da relevância de conteúdos. No entanto, se se derem ao trabalho de clicar nos links, notarão que cada um leva a um jornal diferente. É verdade, parece que a roupa, o almoço, e a temperatura da água do duche de José Sócrates são considerados como merecedores de serem noticiados por todos os meios de comunicação Portugueses.

Para além das referidas acima, somos ainda todos os dias bombardeados com notícias sobre quem foi visitar Sócrates nesse dia, e se o chamou animado ou abatido. Todas estas pecam pela irrelevância. Ainda pior, na minha opinião, são os mexericos maliciosos (que muito dificilmente passarão por notícia, mesmo para os mais distraídos) com que têm tentado enlamear ainda mais o seu nome, como por exemplo o preço da sua casa em Pariso facto de fazer compras em lojas caras e as fracas vendas do seu livro (por acaso já li e não achei nada de especial, para os interessados). E sim, são ainda mais três meios de comunicação diferentes. A parcialidade de pivots de jornal a comentar (é este o termo técnico, e não noticiar como por vezes se diz) o caso é gritante e uma vergonha para o jornalismo nacional (a começar por José Rodrigues dos Santos, que por já agora aproveito para opinar que escreve bastante bem).

O que interessa nisto tudo compreender é se facto existiu corrupção e abuso de poderes. Mas disso pouco se fala, até porque os jornalistas ainda nada devem saber sobre o assunto. E ainda bem, já que é sinal de que, pelo menos nesta fase, existe algum segredo de justiça. De mencionar ainda aquela que parece ser a atitude de grande parte da população (não vamos perder tempo a esmiuçar pessoas com relevância políticas a escrever "yupii" e derivados no facebook). Ao invés de ficarmos preocupados com o facto de que um alto-governante que conseguiu ser eleito (eleito sim, por muito que toda a gente pareça pensar que foi alguma espécia de usuarpador) por duas vezes (uma delas com maioria absoluta) possa ter estado envolto em corrupção e desvio de fundos, parece que toda a gente entrou num estado de júbilo e exaltação. O comentário mais comum até deve ser "espero que muitos mais o sigam". Que a opinião geral seja a de que todas os governantes são corruptos e ladrões é preocupantes. Que isso não tenha aparente correspondência na nossa direcção de voto é ainda mais.


Filipe Baptista de Morais

* Há uma diferença, não tão subtil quanto por vezes nos querem fazer crer, entre noticiar um caso policial e violar o segredo de justiça. A primeira trata-se de um trabalho de investigação e divulgação de um jornalista, sendo que a segunda requere necessariamente o envolvimento de um dos intervenientes no processo (polícias, procuradores, juízes, etc...). Creio que, num certo sentido, a violação do segredo de justiça não é portanto da responsabilidade do jornalista, mas sim dos seus informadores. Esta tem sido flagrante ao longo do caso (a começar pela presença de meios comunicação no momento da detenção) e é grave o suficiente para merecer uma investigação séria.

domingo, 23 de novembro de 2014

Selecção Artificial

Recentemente li uma reflexão interessantíssima n'Observador sobre os critérios de admissão à faculdade. Estes raramente são debatidos ou postos em causa e, quando o são, geralmente é com o intuito de sugerir pequenas alterações, nomeadamente na proporção devida às notas do secundário e aos exames nacionais.

O esquema actual é, na minha opinião, tremendamente injusto. Por um lado, coloca bastante peso numa única prova, que ainda por cima nem tem direito a revisão presencial. Por outro está sujeita à enorme variabilidade da exigência entre escolas.

Em relação a esta última devo dizer que, ao contrário do que parece ser a opinião do cronista d'Observador, não creio que o principal problema seja o inflaccionamento consciente (pela positiva) de notas no privado. Penso que a falta de exigência de muitas escolas (em ambos os regimes) ou, se preferirmos, os diferentes graus de exigência e/ou as diferentes políticas classificativas das escolas são já em si enormes e suficientes para tornar o actual sistema extremamente injusto.

Há outros, claro. Muitas Universidades americanas entrevistam os candidatos, seleccionando-os como se de um emprego se tratasse. Ao ler o texto acima referido aprendi que na Alemanha é requisitado aos alunos cuja nota no exame nacional seja muito díspar em relação à da escolha que repitam o exame.E que em França podemos entrar (sem selecção) no curso que queremos, sendo a própria Universidade a realizar a selecção ao fim de um ano.

Dos esquemas mencionados parece-me ser mais justo o francês, embora seja claramente pouco eficiente. No entanto, penso que teríamos muito a ganhar ao aumentar os poderes/deveres das faculdades naquilo a que a escolha dos candidados diz respeito.

Quero acrescentar, também,  que vejo nos problemas de admissão ao ensino superior um mero sintoma de um mal maior. Mal este que se estende por todo o tipo de selecções  na funcção pública, seja a colocação de professores, a prova nacional de seriação dos médicos ou os concursos públicos. Creio que, no receio de que os processos sejam susceptíveis de favorecimentos da parte de agentes corruptos nos esforçamos demasiado por encontrar uma fórmula mágica, totalmente impessoal e determinística, que nos permita seriar os candidatos sem qualquer input da parte das instituições. E assim inventam  um qualquer exames, ou um qualquer processo que nos permita atribuir um número (e.g: nota) incontestável a cada pessoal. O problema é que esses números nunca podem reflectir totalmente nem as capacidades dos candidatos, nem as necessidades das instituições (até porque estas últimas são plásticas). E, no receio obcessivo de que um ou outro gato pingado seja favorecido, acabamos por eleger sistemas que são injustos para toda a gente. Penso que são muitas as áreas onde a descentralização, leia-se, o aumento da autonomia e dos poderes de decisão llocal relativamente a estas matérias traria mais justiça e, também, melhores resultados.


Filipe Baptista de Morais

Carreiras Abortadas

Foi hoje notícia em vários jornais que, em concursos de selecção para unidades de Serviço Nacional de Saúde (SNS), foi perguntado às médicas candidatas se estavam a pensar engravidar. O caso está a gerar uma compreensível onda de contestação contra aquilo que é uma clara forma de discriminação.

Para ter pretensões de resolver um problema há que, primeiro, compreendê-lo. E é importante que se perceba que quem faz estas perguntas não tem nada contra bébés, nem contra as mulheres em geral. Do ponto de vista da empresa, ficar temporariamente sem uma funcionária representa uma importante perda de produtividade. Claro que há subsídios estatais para compensar este efeito, mas serão suficientes para compensar os prejuízos?

É de notar, também, que o caso reportado se refere ao sector público, tipicamente menos preocupado com produtividades e com uma mentalidade menos capitalista (já que se trata de dinheiro alheio). Então porquê a preocupação com os planos familiares das médicas? Porque as chefias, a ter consciência social (e acredito que a tenham) se preocupam com a capacidade de prestar serviços da sua equipa. Este problema é bem real, já que como é bem sabido o mercado de trabalho Português e tradicionalmente pouco flexível, nomeadamente no que toca à rotatividade dos trabalhadores (trabalho temporário e despedimentos). Conheço inclusivamente pessoas (nem todas homens) com cargos de chefia no sector que têm essa preocupação de não ter demasiadas mulheres na equipa, devido ao elevado número de baixas prolongadas na equipa (agravadas quando co-existem no tempo) a que as gravidezes por vezes levam.

Os pontos acima pendem-se, essencialmente, com as dificuldades de substituição que advém de um mercado de trabalho rígido. Há, contudo, outras dificuldades a acrescer. Em trabalhos especializados é comum ser necessário um tempo de formação até que o trabalhador se torne produtivo (mais uma vez isto não se refere unicamente à perspectiva de fazer lucro, mas também de prestar um serviço). Estas situações, nada raras, tornam extremamente indesejável substituir temporariamente trabalhadores, mesmo quando tal é possível.

Todo este raciocínio não tem o intuito de desculpabilizar a discriminação. Simplesmente acredito que, para atacar o problema de uma forma relevante, é necessário entender e ter em conta aquilo que está verdadeiramente em causa, e não falar cegamente de uma discriminação em relação às mulheres imposta por uma sociedade machista.

Goste-se ou não, a possibilidade de gravidez causa verdadeiros entraves à assumção de papeis mais importantes nas empresas em que trabalham (e.g: cargos de chefia). Passando por qualquer empresa encontram-se trabalhadores fulcrais, cuja ausência empata todo o tipo de serviços/projectos e leva a prejuízos colossais. É portanto natural que exista uma certa relutância em atribuir esses papéis a mulheres com possibilidades de engravidar. Contudo, ignora-se sistematicamente esta realidade, culpando a discriminação na contração, o baixo número de mulheres em postos de chefia e, de uma forma geral, os salários mais baixos auferidos por mulheres (embora existam outras razões para esta última) no machismo discriminatório dos recrutadores. Muitos deles (arriscar-me-ia a dizer a maioria) mulheres.

Não tenho solução a propôr para este problema. O melhoramento dos incentivos e a flexibilização do mercado de trabalho podem mitigá-lo, mas não fazê-lo desaparecer. É possível que estas medidas, aliadas à remoção de incentivos potencialmente perversos direccionados às chefias (e.g: bónus salariais consoante a produtividade da equipa) seja suficiente para efectivamente resolver o problema no serviço público. Afinal, este é controlado pelo Estado, que tem interesse em adotar uma visão mais abrangente e incentivadora da natalidade, assim como os meios para a pôr em prática. Já o privado não tem nem o interesse nem os meios para tal.

Devo ainda referir que outras medidas que começam a ser populares (como uma % mínima de mulheres em listas partidárias, comissões parlamentares, ou nos quadros de direcção de empresas) são, na minha opinião, extramamente mal direccionadas e, agora sim, injustamente discriminatórias. Talvez um dia os empregos deixem de ter o propósito de geral valor e passem a ser meros instrumentos de satisfacção pessoal, fazendo o problema efectivamente desaparecer. Ou talvez as empresas ganhem uma consciência social superior. Até lá, resta-nos reconhecer  problema frontalmente e sem falsas retóricas, e esperar alguma iluminação.


Filipe Baptista de Morais

domingo, 2 de novembro de 2014

Jogo Perverso

No outro dia dei por mim a reflectir mais uma vez sobre aquilo que considero uma séria, embora geralmente menosprezada, ameaça às democracias actuais: o voto útil.

O perigo é fácil de explicar: consoante o # de votos de cada partido, este elege o correspndente número de deputados, mantendo-se assim na assembleia uma proporção que espelha as preferências dos eleitores. Se estes não votam de acordo com a sua consciência (como é o caso do voto útil, embora haja outros) temos um problema de representatividade.

A razão de ser do voto útil prende-se com o facto de os eleitores tentarem manipular o sistema (playing the system), o que só é possível devido a dois factores. Em primeiro lugar, conhecem o sistema voto (cada pessoa tem direito a um voto). Em segundo, têm conhecimento à priori (antes de abrirem as urnas) das intenções de voto da restante população.

Seria portanto tentador proibir as sondagens, com o intuito de proteger os cidadãos da perversão democrática que daí advém. Que trazem elas de positivo, anyway? Para além de influenciarem os eleitores, influenciam também os partidos, que adotam medidas mais populistas se vêem que estão a perder eleitorado. Isto pode parecer não ter nada de mal, já que estão a ir de encontro àquilo que os cidadãos querem. Mas não é assim que funciona uma democracia límpida e honesta: nela, os partidos apresentam os seus programas com total indiferença à reacção que provocam, colhendo de seguida os votos que estes lhes mereceram. Loops de feedback serão sempre uma perversão deste modelo ideal.

Parece então impossível impedir este jogocom as regras das eleições. Há, contudo, soluções possíveis. Umas delas seria alterar as regras do jogo.

Embora o esquema uma pessoa - um voto esteja tão enraizado que muitos simplesmente o encaram como O sistema eleitoral democrático, a verdade é que há outros sistemas que respeitariam os critérios de igualdade e representatividade exigidos numa sociedade demcorática. Por exemplo, as pessoas poderiam ordenar todos os partidos consoante a sua preferência (não olhando portanto apenas para a primeira escolha). Ou cada pessoa poderia ter N votos e distribuí-los de acordo com as suas preferências.

Os dois sistemas acima referidos não seriam susceptíveis de serem manipulados da mesma forma que o actual. Sê-lo-iam de outras, certamente. Uma solução passaria então por sortear o sistema a utilizar (de entre vários previamente seleccionados como compatíveis com as exigências democráticas) apenas após as eleições. Não sabendo de antemão as regras do jogo, seria mais difícil pervertê-lo.

Parece complicado? Certamente, e é bastante provável que existam outras soluções mais simples e elegantes. Ou talvez o problema não seja assim tão grande que mereça tanta atenção. Mas um exercício de raciocínio nunca foi inaproridado.


Filipe Baptista de Morais

sábado, 25 de outubro de 2014

Plasticidade da Igreja

Hoje cruzei-me com um texto muito interessante sobre as pressões existentes "para fazer coincidir igreja e sociedade", cuja leitora recomendo já que me revejo na maior parte das ideias aí expostas. De facto, é impossível ignorar toda a evolução da igreja católica ao longo de mais de dois milhares de anos; evolução essa que foi sem dúvida essencial para que esta se mantenha como uma das principais referências religiosas do século XXI a nível mundial.

A palavra evolução encontra-se destacada pois de facto é dessa forma que a Igreja (e os próprios fiéis) geralmente justificiam alterações (drásticas, por vezes) nos comportamentos condenados, aceites ou recomendados por esta. Assim como nos comportamentos que esta adopta. E, após cada evolução, parece que a Igreja se encontra mais iluminada, que aquilo que defendeu durante vários séculos estava obviamente errado e que, agora que o conseguem ver, isso é claro como água.

A realidade, contudo, é outra. A Igreja simplesmente adapta as suas crenças quando estas entram em conflito demasiado vincado com a sociedade, de modo a não perder com o contacto com esta. Mas os livros religiosas em que estas se baseiam continuam a ser os mesmos. As suas palavras não mudaram. Serão as escrituras tão impenetráveis que, passadas largas centenas de anos, continuemos a re-interpretá-las radicalmente? Claro que não. A realidade é que já pouco delas se aproveita na Igreja de hoje em dia, e menos ainda se aproveitará na do futuro. As passagens indesejáveis (por vezes até contraditórias com outras passagens) são rapidamente qualificadas de metafóricas, e re-interpretas de formas que muitas vezes roçam o ridículo. Por vezes, parece que as pessoas pensam que a metáfora é uma figura de estilo que consiste em dizer algo quando na realidade se pretende dizer o oposto. Hint: não é.

Um comentário qualquer a uma notícia do jornal online observador previa que em 2100 as únicas organizações ainda existentes seriam a Igreja Católica e o PCP, por serem as únicas que se mantêm fiéis aos seus ideais. É possível, de facto, defender que a Igreja sempre se manteve fiel aos seus ideais. Mas apenas tendo em conta que os alterou sempre que conveniente ou necessário. É muito provável que a Igreja Católica ainda exista (e de forma expressiva) em 2100, sim, mas precisamente pelo motivo oposto. O que a torna uma organização tão resistente ao passar dos anos é precisamente a forma como consegue ir descartando as crenças e idealogias quando estas passam a ser consideradas obsoletas. Na realidade, não se deveria dizer que a Igreja Católica tem centenas de anos, já que a Igreja que conhecemos muito pouco terá em comum com a sua progenitora.

Também interessante no mesmo texto é a referência ao esforço da parte da sociedade de incluir a Igreja. De facto, parece-me que a Igreja usufruiu do mesmo estatuto bonificado de certos bancos: é demasiado grande para falhar.

domingo, 28 de setembro de 2014

Transparência nas Greves

Na quinta-feira passada teve lugar mais uma greve dos trabalhadores do metro de Lisboa, esta total (24h). Diho mais uma porque entre greves totais, parciais e plenários dos trabalhadores deve ser raro o mês em que não haja falhas.

A greve deveu-se, obviamente, a questões salariais e de condições de trabalho. Não vou aqui discutir ou analisar a  sua legitimidade. Vou antes criticar a forma como trabalhadores, sindicatos e jornalistas tentaram encobrir essas motivações, substituindo-as por outras mais nobres.

Uma das razões invocadas oficialmente é a de reivindicar um "investimento que permita a reposição de um serviço com a qualidade e a segurança a que os utentes têm direito". Parece bonito. Mas não será essa uma luta dos utentes, ou dos cidadãos em geral, e não dos trabalhadores? A tentativa de tentar mascarar a greve como uma acção pró-utente revela-se patética a qualquer pessoa que se dê ao trabalho de perguntar a opinião a um utente.

Outro dos motivos invocados é o facto de os trabalhadores e sindicatos não concordarem com a eventual privatização do metro de Lisboa. Mas, que eu sabia, nenhum deles exerce qualquer cargo executivo na empresa. Pode não ser intuitivo, mas eles têm tanto direito a opinar sobre e influenciar essa decisão como eu; isto é, quando o fazem fazem-no enquanto cidadãos a criticar a gestão de uma empresa pública e não enquanto trabalhadores da mesma. Seria equivalente a fazerem greve devido ao elevado valor das taxas moderadores no SNS, ou ao aumento do IVA da restauração. Não faz sentido. Similarmente à motivação anterior esta luta, a existir, é uma luta dos cidadãos em geral e a realizar com os meios ao seu dispôr (protestos, manifestações, urnas, etc...).

Há que respeitar o protesto (cuja forma está consagrada na lei), dos trabalhadores. Mas façam-no de forma aberta e transparente, não inventando motivos rebuscados para dizerem que estão a defender os direitos de outrem.


Filipe Baptista de Morais

segunda-feira, 15 de setembro de 2014

Justiça Suspensa

A ex-ministra da educação Maria de Lurdes Rodrigues foi hoje condenada a três anos e seis meses de prisão, com pena suspensa. Certamente serão muitas as vozes que se revoltarão, dizendo que mais uma vez o poder ou as influências políticas safaram alguém de cumprir pena pelos seus crimes. Mas, vendo bem, o que não falta por aí são penas suspensas (outra, outra, ainda outra e uma notícia sobre o assunto), e parece-me que tão depressa são atribuídas a ex-ministros como ao Zé Povinho. O que não significa que não seja digno de indignação.

Afinal, qual a justificação para uma pena suspensa? A meu ver, esta seria apenas adequada a delitos considerados não graves, sendo uma espécie de segunda oportunidade concedida a um cidadão cumpridor que cometeu um pequeno deslize. Mas o caso que referi acima (assim como muitos outros) é de um crime que o tribunal considerou suficientemente grave para merecer vários anos de prisão. Anos. Um ano na prisão é, parece-me, um castigo bastante duro e não me parece de todo que encaixe nos candidados a pena suspensa que pintei acima.

Parece-me, sim, que as penas suspensas têm sido incentivadas por razões orçamentais, tanto por falta de espaço nas prisões como pelos custos associados à manutenção dos reclusos.

Na Justiça, como em tudo (mesmo na Saúde por muito que nos custe considerá-lo e admiti-lo) as questões orçamentais, que é como quem diz o custo do Sistema, não podem ser ignoradas. Contudo, a solução passa pela re-estruturação e, eventualmente, pela reconcepção do Sistema. Nunca pela perversão de alguns dos seus mecanismos de triagem/avaliação, dando a entender que estes são função do resultado desejado, e não vice-versa como deveria ser.


Filipe Baptista de Morais

sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Autoridade Alheia

No início do mês o cardeal patriarca de Lisboa comparou o "BES ao jogo Mikado". Porquê, nem me dei ao trabalho de descobrir. Não interessa. O que me parece interessante perceber aqui é porque raio está um dos líderes religiosos do país a pronunciar-se sobre um caso que diz respeito à economia e, eventualmente, à justiça do país.

Verdade seja dita, a culpa nem é do pobre homem mas do jornalista que o consultou neste assunto. Porque não perguntar antes à Susana Félix, ao Bruno de Carvalho ou, já que claramente não existe grande critério, a mim? Poderíamos considerar o acto de responder como criticável em si (já antes escrevi aqui a tremenda promiscuidade existe entre política e religião, sendo óbvio que poderia ter incluído mais áreas na lista), mas hoje vou antes chamar a atenção para a importância que as pessoas (sejam os próprios meios de comunicação social, ou o consumidor final) deram às suas palavras.

Este fenómeno de extrapolar a autoridade que uma entidade possui num campo para outros é conhecido, sendo estudado pela psicologia e explorado pelo marketing. Explica porque temos treinadores e jogadores de futebol (assim como actores de telenovelas) a protagonizarem anúncios a produtos financeiros, por exemplo.

Precisamente por ser um enviesamento de raciocínio bem conhecido, os meios de comunicação social deviam fazer os possíveis por proteger os utentes dos seus efeitos. Infelizmente, vende mais ter uma cara conhecida na televisão a pronunciar-se sobre seja que for. Ou talvez os próprios jornalistas estejam alheios ao disparate em que estão a incorrer. Espero sinceramente que os entrevistados (neste caso o patriarca) estejam, caso contrário seria uma clara demonstração de má fé (no pun intended).

Seja intencional ou não, há uma crise enorme de autoridade alheia, auto induzida/proclamada como incentivada pelos media. Não contribuamos nós também com para esta totalmente arbitrária distribuição de autoridade; sejamos critícos e retiremo-la quando não merecida.


Filipe Baptista de morais

quinta-feira, 28 de agosto de 2014

Na Muche

Hoje apeteceu-me escrever sobre um dos flagelos da nossa sociedade actual, ignorado pela classe política devido à elevada pressão dos lobbies gay e do alto patronato, à falta de representatividade do zé povinho e, claro, à crise económica. Embora não seja consensual, também há quem diga que a culpa é da Merkel. Falo, como com certamente já terão deduzido, do triste estado em que geralmente se encontram as casas-de-banho dos comboios da CP.

Estes WC são tipicamente, na gíria do viajante/utente, um nojo. Para os leitores menos familiarizados com o termo, ele tipicamente refere-se à presença de urina e/ou fezes (sem detrimento de outros fluidos corporais) um pouco por todo lado, sendo que tipicamente existe algum ênfase no assento da sanita. Para os homens, a menos de algum aperto agudo intestinal, isto pode não ser um problema de maior (principalmente se, como eu há poucos dias, viajarem com o nariz extremamente congestionado) mas é sem dúvida extremamente desagradável para as mulheres. As razões que levam a este problema são várias e diversas (quase parece que estou a dizer alguma coisa, não é?), sendo analisados em seguida. Será dada particular atenção a potenciais soluções/improvements, principalmente aos mais práticos e baratos.
  1. O primeiro e eventualmente maior problema das casas-de-banho dos comboios é, sem dúvida, a enorme afluência. Aqui já se têm dado enormes passos no sentido de minimizar o problema, através da redução do poder de compra e do aumento do preço dos bilhetes. Porventura mais subtil, mas não menos genial ou eficaz, o abandono de muitas praias às intempéries levou a uma enorme redução do areal disponível e à existência de inúmeras arribas em perigo iminente de derrocada, o que poderia ser um factor importante no descongestionamento da linha Lisboa-Algarve. Infelizmente, verifica-se que o problema se mantém, pelo que claramente não pode ser atacado apenas por esta via.
  2. Outro grande problema é a falta de civismo das pessoas que insistem em comportamentos como não utilizar o autoclismo, não levantar o assento da sanita para urinar (no caso dos homens), entre outros. A falta de civismo combate-se, creio eu, através da educação. Mas esta demora a surtir efeitos, para além de que é complicada de implementar eficazmente e, pior, dispendiosa. É também muito chata (lembram-se daquelas aulas de História ou Português?),  podendo cair naquela categoria de emendas que são piores que os sonetos (isto faz sentido?).
  3. Os atrasos nos comboios, aparentemente um problema totalmente perpendicular ao abordado, também são relevantes já que aumentam a duração das viagens e, consecutivamente, agravam o primeiro ponto que referimos. Confesso que tenho alguma dificuldade em perceber como se podem os comboios sistematicamente atrasar (e não, não é igual em todo o lado) já que certamente não apanham trânsito inesperado. Seja como for, melhorar esta situação requereria, muito provavelmente, melhor organização e planeamento dos transportes púbicos, o que também está obviamente fora de questão.
  4. Uma questão importante também é a de pontaria. Ainda que muitos homens tenham a iniciativa de levantar o assento e apontar cuidadosamente para o centro da sanita ao urinar, é certo e sabido que nem todos os jactos são bem direccionados. Seria de pensar que toda uma vida de treino seria suficiente para aprimorar a técnica, mas também não é verdade que o Voldemort (verdadeiro mestre da varinha) acertava em tudo menos no seu alvo, o jovem Potter? Este problema é agravado por um simples facto: o comboio mexe-se. As mulheres estarão porventura agora a franzir o sobrolho, mas certamente que muitos homens (alguns sem dúvida orgulhosos da sua pontaria em situações mais normais) sabem como uma carruagem a oscilar dificulta o acto de acertar na sanita *. A solução passaria, obviamente, por manter os comboios parados, mas por alguma razão a CP não se tem mostrado muito receptiva a esta ideia (joguinhos dos sindicatos porventura?)
  5. O anterior ponto poderia não ser tão importante, se o assento da sanita estivesse propriamente levantado durante o acto. E aqui sim, temos um problema que tem uma solução simples, barata e eficaz. Certamente que hão-de ter reparado que os assentos (assim como os tampos), com o oscilar da carruagem, têm uma certa tendência para voltar a baixar, ainda para mais repentinamente. Isto leva a que muitos homens, receosos de uma dolorosa mutilação genital e sem grande vontade de segurar no molhado assento com a mão durante o acto (até porque há quem prefira usar as duas) opte por não levantar o assento. Dentro dos que o levantam, mas não o seguram, certamente que uma grande percentagem será surpreendida pela abrupta descida deste, tendo sem dúvida reflexos institivos que seriam divertidos se não resultassem em desgovernados repuxos amarelados. Solução? Um simples encaixe na parede da carruagem, como os que usam no lado de fora das janelas, para prender a tampa e o assento.
     
Surpreendidos com o tópico? Bom, se reparem há quase dois meses que não escrevia nada para o blog. Com tanta falta de treino, é normal que só saiam textos de merda.


Filipe Baptista de Morais

* Estudos sugerem que cada 10Km/h de velocidade extra na carruagem correspondem a, aproxidamente, duas cervejas em circulação sanguínea.

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Perseguindo os perseguidores, sem cepticismo

Há poucos dias deparei-me com uma notícia do público que estava a gerar uma considerável reacção por parte da população. Como sempre, há mais um do que aspecto a merecer referência.

Primeiro, a leviandade com que se extrapola e se tiram conclusões far-fetched de estudos. Não é de todo uma novidade que o espírito crítico e/ou céptico está em vias de extinção()*, mas nunca me deixa de espantar a fraqueza desse espírito, mesmo quando os dados estão à vista. A notícia cita os autores, que alegam que o estudo prova (acredito que o termo escolhido tenha sido obra do jornalista, mas nunca se sabe) que “os estados emocionais podem ser transferidos para outras pessoas através do contágio emocional”. Ora, segundo os dados publicados na mesma notícia, houve "um decréscimo de 0,1% no número de palavras positivas, no grupo dos utilizadores que viram reduzidas as publicações com o mesmo tipo de vocábulos no seu feed, e uma diminuição de 0,07% no total de palavras negativas entre os que foram menos expostos a esse tipo de conteúdos." Percentagens bastante baixinhas diria. Mas talvez sejam significantes dado o # de palavras escritas? Ora pois bem, felizmente a notícia elucida-nos em relação a esse aspecto também. Procurando os números e fazendo uns cálculos simples chegamos à conclusão que os participantes no estudo disseram, em média, 177 palavras. Sendo que 3.6% eram negativas e 1.6% positivas, os participantes disseram em média 6.372 palavras negativas e 2.832 palavras positivas. Agora sem grande rigor estatístico (não é de todo necessário para exprimir este ponto de vista) o tal decréscimo de 0.1% significa que os participante sujeitos a feeds negativos disseram, em média, por volta de menos três milésimas de palavra. No outro caso, estamos a falar de menos de cinco milésimas de palavra. Ora, eu não sei exactamente o que é uma milésima de palavra, mas não me parece algo muito relevante.

Para além dos pequeninos números, há a meu ver outra grande falha nas conslusões desse estudo, que foi o ignorarem completamente o princípio da navalha de Occam.  Ao invés de assumir que os estados emocionais estavam a ser transferidos (*2), não seria mais plausível assumir que as pessoas utilizam com mais frequência as palavras que estão costumadas a ver e ouvir? Afinal, a heurística da disponibilidade é conhecida e está bem estudada e documentada, sendo para além disso relativamente intuitiva e óbvia.

Conclusões e sua robustez à parte, não deixa de ser interessante a indignação exposta por tantos utentes do facebook, ao verem os seus feeds manipulados por algum algoritmo. Esquecemo-nos que na realidade eles já são manipulados, simplesmente por outro algoritmo. A notícia refere isso mesmo perto do fim, acrescentando que "Não é a rede tal como a veríamos sem filtros". Apesar de verdade, penso que a afirmação pode gerar certas dúvidas. É que a "rede sem filtros" é um conceito puramente teórico/filosófico, sem qualquer significado na realidade. Não existe. Não poderia existir. Isso significaria que estaríamos a ver todos os feeds jamais publicados, por nenhuma ordem em particular. E nenhuma ordem exclui até a popular ordem aleatória. Os investigadores limitaram-se, simplesmente, a altear o algoritmo que escolhe aquilo que queremos ver. Mais, enquanto que o algoritmo usual tem o intuito óbvio e admitido de manipular (mostra-nos aquilo que queremos ver, de modo a que gostemos de lá ir), este prendia-se apenas com fins científicos e estatísticos. Não sejamos paranóicos. Forçar que tais inofensivos estudos careçam de avios e autorização prévio é retirar-lhes qualquer valor que eles alguma vez poderiam vir a ter. Nunca os (pseudo) perseguidores foram tão perseguidos.


Filipe Baptista de Morais

*Já agora aproveito para sugerir que se inforem sobre a Comunidade Céptica Portuguesa, assisti o ano passado a umas paletras muitos interessantes organizadas por eles.

(*2) Devo agora talvez salientar que acredito piamente que os estados emocionais são contagiantes; apenas critico a suposta prova dessa tese.

terça-feira, 24 de junho de 2014

A Prescrição do Crime

Hoje, sem qualquer notícia a fornecer contexto ou nota introdutória, venho escrever sobre algo que me faz espécia há muito tempo: a prescrição de crimes.

Nunca consegui perceber a lógica por detrás destes mecanismo. Afinal, porque há-de o crime deixar de o ser simplesmente pelo passar dos anos? É certo que os processos não podem permanecer abertos indifinidamente com recursos alocados à sua resolução, mas poderiam certamente aguardar suspensos e no caso de, como por vezes acontece, aparecerem novas informações (ou personagens) serem retomados.

Não vejo nada nas prescrições que não seja uma protecção injustificada do criminoso. Fá-lo ao garantir uma amnistia ao fugitivo habilidoso que se evada por tempo suficiente, quando na realidade deveria era ter a pena aumentada por fugir à justiça durante tanto tempo, quando na realidade deveria era ter a pena aumentada por fugir à justiça durante tanto tempo. Mas o mecanismo da prescrição tem um efeito ainda mais perverso no sistema judicial.

Ao estabelecer um prazo limite para a acusação atingir uma condenação cria-se toda uma nova estratégia de defesa: o arrastar o processo até este prescrever. E assim temos todos aqueles processos em que a defesa não se preocupa verdadeiramente em demonstrar a inocência dos seus clientes, mas antes em encontrar artifícios técnicos que permitam o adiamento das audiências e, consequentemente, que se atinja alguma sentença.

As prescrições contribuem assim de duas maneiras distintas e igualmente gravosas para a injustiça: a injustificada protecção do criminoso e a sobrecarga de um já de si saturado sistema judicial. Isto se não considerarmos uma terceira consequência, que pode ser até a mais danosa a uma democracia: a contribuição para a descrença e desrespeito pelo sistema penal e judicial.


Filipe Baptista de Morais

Responsabilidade Promíscua

Para introduzir este tema vou recorrer a um recorte de jornal que tinha guardado precisamente para esse efeito, datado de 2 de Dezembro do ano passado. A pequena notícia, referente ao mediático caso Prestige, dizia assim "O vice-presidente da Xunta da Galiza, Alfonso Rueda, garantiu ontem que governo galego vai recorrer do caso Prestrige até que se encontre alguém que seja responsabilizado pelo desastre ambiental de 2002.

Quando se trata de justiça não me agrada, de todo, que se utilizem expressões como a citada. Até que se encontre alguém que seja responsabilizado parece apelar a uma cruzada para encontrar algo que apazigue a turba que clama por sangue: não o responsável mas alguém que seja responsabilizado. Mesmo ignorando esse pequeno detalhe (que provavelmente advém apenas de uma terminologia menos inspirada, parece-me haver uma premissa interessante de analisar. Até que se encontre alguém assume claramente que há culpado. Curiosamente, alguém indica precisamente que não fazem a menor ideia de quem seja o dito. Assumir à partida que há culpado para um desastre é, infelizmente, muito comum. Particularmente em desastres de grandes proporções, em que as consequências são mais trágicas, ninguém quer que a culpa morra solteira. Mesmo que ela não tenha um par à altura.

Outro erro muito comum é o de julgarmos que quando as coisas correm mal é necessário mudar algo. Ou, de forma equivalente, que não é preciso mudar nada quando tudo parece estar a correr bem. No fundo, subestimamos largamento o papel do acaso nos eventos que nos rodeiam, sobreestimando o controlo que exercemos sobre os mesmos.

Ambas as situações requerem uma cuidadosa análise dos pares causa-efeito presentes, assim como da informação e meios disponíveis na altura das descisões*, não podendo nunca ser considerados apenas os outcomes.

E não podemos deixar que a gravidade de uma ocorrência nos leve a tirar conclusões àcerca de responsabilidades.


Filipe Baptista de Morais

* De factor, esta contextualização revela-se muitas vezes surpreendentemente difícil de executar, levando a erradas imputações de culpa ou falha.

domingo, 8 de junho de 2014

Jornalismo policial e policiamento jornalístico

Há pouco estava a ver na televisão os mais recentes desenvolvimentos em torno do caso Maddie. Ignorando o caso em si, assim como a forma como tem sido conduzido ao longo dos anos (já se escreveu demasiado sobre o assunto) houve dois aspectos que me chamaram a atenção na reportagem.

 O primeiro tem a ver com o número de operacionais (penso que da PSP e GNR) destacados para o local. As imagens que vi mostravam uma ou duas pessoas a escavar, outros tantos a conduzir cães e um número consideravelmente superior a assistir (liderar?). Dado que não me parecem ser operações perigosas (estão à procura de um corpo, não de um assassino) não entendo a necessidade de tanto aparato policial.

Mais interessante que isso (já que até aqui não disse nenhuma novidade) foram os meios utilizados pelos jornalistas para a obtenção de imagens (*). Confrontados com uma barreira policial montada pela Scotland Yard alguns jornalistas utilizaram drones para obter as imagens que queriam. Menos de um mês depois de a Comissão Nacional para a Protecção de Dados ter considerado que a PSP não poderia utilizar um drone para vigiar as multidões reunidas durante a final da Champions Leagues (*2), não pude deixar de me questionar sobre a legalidade de tal procedimento.
É fácil perceber que a CNPD considerou que a PSP estava a invadir em demasia a privacidade dos cidadãos, ainda que com o objectivo de os proteger, à semelhança das reacções (tanto da opinião pública como de diversos organismos por todo o mundo) ao recente escândalo com a NSA. Mas será que os jornalistas, escudados, sob a liberdade de imprensa, terão direito a tratamento preferencial? Ou que, como me parece ser o caso, a legistação Portuguesa é ainda tão omissa e ambígua em relação ao uso de drones que apenas o restringe quando operados por forças de segurança, precisamente aquelas que deveriam ter mais liberdade nesses aspectos? Aguardo, interessadom por futuras notícias em relação a esse aspecto.


Filipe Baptista de Morais


(*) Não duvido também, e isso vê-se nalgumas imagens, que o eram mais os meios policiais destinados a manter os jornalistas afastados na operação do que os envolvidos na operação em si. Não deixa de ser um reparo interessante.

(*2) Num episódio algo caricato o parecer apenas foi emitido dias depois do jogo, pelo que o drone foi utilizado e as imagens posteriormente eliminadas.






domingo, 25 de maio de 2014

Atlântida

 Embora um pouco atrasado, decidi falar um pouco sobre os Açores, onde passei umas curtas férias (4 noites) no passado Março. Mais concretamente, falo da ilha de São Miguel, sendo que as restantes não ficaram certamente por visitar.

São Miguel aparenta ser o resultado de uma (pacífica?) guerra entre o Homem e a Natureza, da qual a última parece ter saído vencedora. Embora a capital, Ponta Delgada, tenha todas as comodidades que se podem esperar de uma cidade (pelo menos enquanto turistas), assim como monumentos de interesse turístico e histórico (portas da cidade, forte de São Brás, diversas igrejas, etc...) o principal atractivo de uma viagem à Ilha são certamente as suas paisagens naturais. Ainda assim, não posso deixar de recomendar que reservem pelo menos um dia para passear pela cidade, e alguns instantes para relaxar com uma bebida nas Portas do Mar (zona de bares/cafés junto das docas, com a entrada pomposamente assinalada, assim como a data da sua inauguração pela ex primeiro ministro José Sócrates). Embora não o tenha desfrutado pessoalmente, penso que também deve ser uma boa zona para diversão nocturna. As ruas são algo apertadas e confusas para conduzir, portanto aproveitem o facto de a cidade ser convenientemente pequena e façam uso das pernas.

Saiamos portanto de Ponta Delgada. O resto da Ilha também não é, na realidades, assim tão vasto, e uma tarde chegaria certamente para dar uma volta completa de carro. Isso, claro, ignorando os miradouros assinalados ao longo da estrada a cada 500m.

Recomendo que façam o mesmo que eu: aluguem um carro (em todo o tempo que andei a passear não vi um único autocarro fora das ruas da cidade, além de vão certamente apreciar a liberdade extra que ser senhor e mestre do nosso tempo nos proporciona), escolham um dos pontos "a não perder" da ilha, e conduzam "vagamente" na sua direcção. Digo vagamente porque grande parto do encanto está precisamente em desviarmo-nos constantemente do caminho para parar nos ditos miradouros ou, melhor ainda, não fazer ideia de em que caminho estamos. Certifiquem-se apenas que levam um co-piloto (penso que resulta melhor se for uma mulher bonita) para vos indicar o caminho de volta. Evitem ao máximo estabelecer horários ou marcações: o clima é de total anti-stress e não convém perturbá-lo.



Dito isto, e como tempo é limitado, convém certamente fazer um planeamento, no sentido de ver quais os pontos a visitar que se encontram próximos, e qual a sequência por que faz mais sentido percorrê-los. Se não gostam ou não confiam nos guais online e em papel não se coíbam de falar com os locais: os Micaelenses são extremamente simpáticos, amistosos e sempre dispostos a ajudar o pobre do turista. Seja como for, façam por não perder a famosa Lagoa das 7 Cidades, a Lagoa do Fogo (pessoalmente considero-a o ponto mais bonito da ilha), a cascata no Nordeste, a costa Sul de um modo geral (o mar Açoreano é lindíssimo...) e as fumarolas. Imperdível também o banho na água férrea (quentinha) das Furnas.

Para os amantes de animais, é bastante fácil aceder a passeios de barco para observação de cetáceos, mesmo fora do Verão. Apesar das preocupações com nao perturbar os animais, podem contar com estar suficientemente próximo de golfinhos para derreter qualquer gaja. Já quanto a baleias, infelizmente não tive a sorte de as poder observar (foi-me dito que é mais fácil no Verão), embora tal se deva em parte ao facto de a nossa saída ter sido encurtada devido a uma das passageiras se estar a sentir mal. Aproveito para deixar a dica: embora não sejam propriamente radicais, estes barcos não são indicados para quem procura uma viagem mais comodista e/ou tenha problemas de coluna ou outros. Para os maiores aventureiros aconselho a informarem-se sobre actividades radicais nas redondezas: creio que há empresas dedicadas a asadelta e afins que devem ser muito interessantes.

Gastronomicamente, come-se muito bem por lá. Os peixes são algo diferentes dos que estou habituado a ver em Lisboa e no Algarve (ou terão apenas outros nomes?) mas isso não me coíbiu de experimentar alguns, do qual não me arrependo. Não deixem, no entanto, de provar comer um (ou mais) bifes da deliciosa e tenta carne Açoreana. Dito isto, recomendo que passem também por um restaurante vegetariano (o único que repeti na minha estadia) em Ponta Delga, chamada Rota das Ilhas. Comida deliciosa (já sabem que não sou vegetariano, portanto não tenho esse enviesamento) e com uma apresentação admirável e, acima de tudo, um excelente atendimento e um espaço muito recatado e acolhedor. Perfeito para um jantar a dois. Não se esqueçam também de provar o típico cozido das Furnas.

 All in all, São Miguel é o sítio perfeito para uma férias mais perto da Natureza, sem abdicar de qualquer comodidade  (incluindo as gastronómicas!), tornando-o uma excelente opção para relaxar e/ou passar um dias com alguém especial. Suponho que também sirva para umas férias mais aventureiras (e bebidas) com um grupo de amigos.


 Filipe Baptista de Morais

Chumbar ou não chumbar: eis a questão

Li recentemente este interessante artigo, sobre os exames escolares no 4º e 6º ano e suas consequências.

Antes de mais gostaria de salientar que todos os comentários que se seguem tomam por certo, numa crença e falta de cepticismo algo incomum em mim, todos os dados que o autor do artido alega virem de estudos ou investigação, apesar de não apresentar referências para os mesmos, como já é hábito no jornalismo. Para quê, se ninguém as vai verificar de qualquer modo?

É muito interessante, e ainda mais perturbador, a envolvente socioeconómica do aluno ter um papel tão preponderante nas notas dos jovens estudantes. Mas não é de todo surpreendente: não é difícil de perceber que uma criança que seja incentivada pelos pais a ir à escola e aprender, que em casa tem o espaço, meios, condições e até apoio necessários ao estudo e à realização dos trabalhos de casa(*) tenha melhores resultados que outra cujos pais vêm a escola como um empecilho, e que ao sair da mesma ainda tem que ir trabalhar nisto ou naquilo. Atrevo-me até a dizer que tal tenderá a propagar-se por muitos anos à frente, já que características como o empenho, dedicação, brio e honestidade (necessárias aos estudante) são certamente plantadas e alimentadas no lar.

Concordo portanto naturalmente que, a haver um exame com poder reprovador, a proporção dos reprovados seja maior nos alunos com piores envolventes socioeconómicas. Já com a conclusão, de que isto levará a maior exclusão social, não posso concordar.

A  escola não serve, como muitos parecem acreditar, para manter as criancinhas entretidas durante 9 ou 12 anos. Serve sim para lhes ensinar competências consideradas essenciais para que vivam o resto das suas vidas de forma autónoma e responsável. Se uma criança do 4º ou do 6º ano não tem as competências previstas no programa escolar, penso ser mais cruel e penalizador deixá-la prosseguir como se nada fosse, em vez de repetir o ano e progredir realmente. Pior, tira das crianças quaisquer pressão e responsabilidades que, convenhamos, são bem necessários quando os pais não lhas transmitem em casa.

O analista da OCDE diz que "em Portugal há uma tendência para equiparar as notas dos exames aos resultados das aprendizagens", como se tal fosse negativo ou descabido. Na minha opinião, apenas o é se os exames forem mal feitos. E de facto são-no muitas vezes (pelo menos eram no meu tempo - mais sobre isto num post para vir). Mas isto apenas quer dizer que se tem de investir mais (não se assustem, não falo de dinheiro) nos meios de avaliação, e não alterar as conclusões e repercussões a tirar dos mesmos.

Outro aspecto a melhorar tem a ver com a mentalidade das pessoas. A criança que chumba não é necessariamente estúpida, preguiçosa ou delinquente. Simplesmente ainda não adquiriu as competências que necessita para transitar de ano. Chumbar uma criança que não obteve o aproveitamente necessário devido, por exemplo, a doença prolongada que a impediu de assistir a grande parte das aulas, não é portanto uma crueldade mas uma infeliz necessidade. E o professor que deixa passar um aluno quando em consciência sabe que ele não merece a nota que lhe vai dar (*2), não o está a ajudar, mas antes a compactuar com um sistema no qual o feedback não reflecte os verdadeiros resultados obtidos. Para um engenheiro de controlo, tal seria equivalente a ter uma retroacção independente e alheada da saída do sistema (ie: resultados), quiçá derivado de um observador mal desenhado (eg: um exame mal formulado), com um desfecho bem conhecido: total imprevisibilidade e, logo, instabilidade (descontrolo).


Filipe Baptista de Morais

(*) Na realidade acredito que os trabalhos de casa são já muitas vezes excessivos, desnecessários e/ou desenquadrados. Mas não é sobre isso que estamos a falar.

(*2) Semelhante aplica-se ao professor que sobe um ou dois valores a um aluno para que este atinja os seus objectivos (exemplo clássico: entrar em medicina). Aí está, de facto, a ajudá-lo, mas à custa de outro pobre desgraçado que teve um professor com maior sensibilidade/consciência social e, atrevo-me a empregar o termo, menos corrupto.

domingo, 11 de maio de 2014

Active Engineering

I've come across this video, which is from a start-up requiring crowd funding to achieve its goal: to make (little) girls more into engineering through clever use of specialty (pink) toys. Besides making money, of course.

This would be a praise worthy goal, were it not twenty years late. Who cares if more women go to engineering in the future, when I'm done with college already? Now, it is only worth mentioning for the social issues it may raise. First of all, why bother with it at all? Would a world with more female engineers be a better one? [ spoiler alert: it would. Trust me, I'm an engineer. ] And then, isn't it wrong to try and machiavellianly push girls into engineering?

Although it may sound so, I would answer negatively to this last question. Truth is, girls are being passively (no evil master-mind behind it) pushed away from engineering. Western culture and education clearly pictures the role of an engineer as a male one, perhaps apart from the fields closer to biology or the environment. Or you can see it the other way around, it pictures men as engineer-like, and women not so much. Of course, one may argue that the skills and personality traits required in Engineering are more appealing to (or more common in) men than women. But, as always, the line between biological pre-disposition and cultural/educational biases is quite blurred.

That being said, this active manipulation (or engineering, as the woman in the video puts it) does not seem wrong at all. In fact, it simply shows some understanding in the way our society works, and actively tries to counter passive manipulation. A noble cause? Perhaps not. But it seems harmless enough as well.


Filipe Baptista de Morais

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Assistência Justa

Em Portugal fala-se muito no conceitor de fair-play, quase sempre associado ao futebol, esse rei que tanto tempo nos ocupa nos noticiários. Embora muitas vezes associado ao combate aos comportamentos racistas, o fair-play é na realidade um conceito que praticamente se abstrai dessa temática. Traduzindo à letra obtemos algo como jogo/jogada justo/a, enquanto que o termo mais comum para o substituir é simplesmente desportivismo. No fundo consiste em jogar o jogo sem artimanhas, sem recorrer a nenhuma vantagem deslear e/ou não permittida. Abrande assim métodos como o doping no ciclismo, o esticar os dedos no final de um soco (para estes atingirem os olhos do adversário) nalguns desportos de combate, e as faltas dissimuladas e os mergulhos para a piscina no futebol.

Penso ser agora totalmente claro que vejo o fair-play como algo transversal a todos os desportos. Mas, mais importante e talvez não tão óbvio, considero-o aplicável não apenas aos jogadores, mas a todos os intervenientes. Assim, um árbitro que tome (consciente e propositadamente) uma decisão incorrecta está a ter falta de fair-play, assim como um dirigente de um clube que tente exercer sobre um organismo desportivo ou um médico que forneça substâncias ilegais aos atletas a seu cargo.

Após esta (longa) introdução queria apenas deixar um pequeno desabafo a respeito de uma grave falta de fair-play que presenciei hoje no centralito, um dos courts onde se disputa o Portugal Open. A partida era entre Gastão Elias e Garcia-Lopez, um atleta Espanhol. O público, claro, apoiava em massa o atleta da casa, aplaudindo-o e puxando por ele, nos bons mas também (algo supreendentemente) nos maus momentos. Isto é bonito de se ver.

Aplaudir erros do adversário é que já é algo que me custa a engolir. Aplaudir faltas no serviço, assim como duplas faltas, parece-me estranho e de mau gosto. Fazer barulho durante o acto de serviço (movemento que requer extrema precisão e coordenação, logo também concentração) é inaceitável. Pior que tudo, foram os muitos assobios e vaias que o atleta Espanhol teve de ouvir ao pedir ao árbitro para verificar uma marca que acreditava comprovar uma má chamada da equipa de arbitragem. O árbitro desceu da cadeira, verificou a marca, e deu-lhe razão; o público explodiu em apupos. Que quer isto dizer? Que queremos que o nosso atleta vença ainda que à custa de más decisões de arbitragem?

Várias destas explosões de falta de fair-play afectaram e desconcentraram claramente Gracia-Lopes, prejudicando sem dúvida a qualidade do seu jogo. A sua irritação para com o público era, aos meus olhos, tão visível como justificada. Não quero com isto tirar qualquer mérito a Gastão Elias, que jogou a sua partida e venceu-a com todo o mérito. Quero apenas deixar uma crítica veemente aos adeptos que incidem neste tipo de comportamentos.

Infelizmente não é a primeira vez que vejo este tipo de comportamentos nesta competição. Cheguei a ver, inclusivé, um jogador a ser vaiado ao erguer a taça de vencedor da competição. Triste. Não sei porquê, mas imagino sempre os tele-espectadores de um jogo de futebol no bar da esquina, a embocar cerveja enquanto petiscam uns tremoços. Já aos de uma partida de ténis, costumo imaginá-los a saborear um whisky velho no bar do hipódromo. Talvez seja apenas uma parvoíce. Mas também pode bem ser que o fair-play não se encontre num casaco e gravata.


Filipe Baptista de Morais


domingo, 20 de abril de 2014

Meia-Maratona da Golegã

No passado dia 13 de Abril participei na Meia-Maratona da Golegã. Esta não será certamente das provas mais conhecidas, mesmo em território nacional, tendo como tecto máximo 300 participantes (atingido e creio que até marginalmente excedido este ano).

Aproveitei ainda para passar o fim-de-semana na vila, onde nunca tinha estado, na clássica fuga à routina citadina. Apesar de não ter grandes atracções turísticas, (o jardim da casa estúdio Carlos Relvas é bem bonito) é um local tranquilo e engraçado para se passear durante um fim-de-semana na melhor das companhias. Como é típico destas zonas, as pessoas são muito simpáticas (e conversadoras...) e come-se muita bem.

Em relação à prova em si tinha um percurso totalmente plano, sendo portanto uma eventual oportunidade para bater records. No meu caso não fui correr sozinho nem com espírito competitivo, pelo que completei a prova com  uma serena 1h 55m. Os postos de apoio eram suficientes e bem distribuídos, com voluntários em trajes típicos a fazerem a distribuição das águas. No final, os 6€ de inscrição ainda serviam para almoço de churrasco num jardim onde creio que se juntou toda a vila ou perto disso. Essa foi a única parte onde a organização talvez tenha falhado um pouco, já que tive de esperar cerca de 2h (ao sol...) para obter a minha comida. Mas por um preço tão acessível não nos podemos queixar, ainda para mais não sendo o churrasco obviamente obrigatório. Ficou a faltar, mais uma vez, a medalha...


Filipe Baptista de Morais

sábado, 19 de abril de 2014

Pedofobia Positiva

No Metro de 17 de Abril de 2014, na secção Correio do Leitor, foi publicada sob o título "Tiques pedofóbicos" uma forte crítica aos restaurantes e hoteis nos quais não é permitida a entrada de crianças. Segundo o indignado leitor, estes são "estranhos conceitos de gestão e discriminação ao serviço de uma burguesia que não procura sossego, mas que pretende viver fechada no seu egoísmo". O autor da rubrica vai ainda mais além, alegando que tais estabelecimentos violam o princípio da igualdade na Declaração dos Direitos da Criança.

Pessoalmente acho que se está a confundir diferenciação e especialização de oferta (de um serviço) com discriminação. E não me parece que tal viole princípio algum. Afinal, em quase todos estes espaços é proibida a entrada de animais domésticos já que, apesar de muitos os adorarem, é relativamente consensual que podem incomodar outros utentes. E não são poucos os hoteis e clubes nocturnos que exigem um dress code aos seus utentes. Isto não é discriminação, apenas especialização da oferta e particularização do público alvo.

E convenhamos que, por muito que se goste delas, as crianças podem ser deveras incómodas. Devo até dizer que tive pena que o indignado leitor/escritor não referisse o nome de nenhum desses estabelecimentos já que, ao procurar um hotel ou restaurante para uma noite especial, não me importaria certamente de pagar um extra para garantir  que o estabelecimento não teria crianças barulhentas. Penso que não sou burguês nem estou fechado no meu egoísmo mas sim que procuro sossego (será assim tão estranho?). Mas talvez esteja errado.


Filipe Baptista de Morais

sábado, 12 de abril de 2014

Public Life

The picture you've certainly noticed before you started reading this was published in Playboy magazine, in November 2011. Certainly that is not surprising news, since that particular magazine has long been known for its interesting photos.

What made this particular picture famous and controversial was the fact that the featured model was also a school teacher in Texas, who got fired after some students' parents showed their discontempt.

Quite a few voices were raised in her defense. The case was often interpreted as discrimination, arguing that one's personal life is nobody else's business and so should not influence professional decisions.

This reminded me of the controversy that rose around a job opening announcement by Portuguese air company TAP, where applicants (for flight attendant position) had to fulfil a batchful of model-like criteria*. The same often happens with receptionist, secretarial or human resources positions.

Should this be seen as a form of harassment, discrimination or otherwise unacceptable professional behaviour? Personally I do not think so. Companies are entitled to choose their staff in the way that best suites their needs, capitalistically speaking. It is a known fact that beautiful people are (unconsciously) perceived as nicer and more successful, which gives them an obvious competitive advantage in any position involving dealing with customers or clients. In that ssense, one's physical attributes may indeed be of importance in terms of competence for a given roll.

Is that discrimnation against uglier people? Only in the same sense that I am discriminated against Cristiano Ronaldo in the football world, high self-esteem and with good rethoric skills people are uphelded in management and ease with number is favoured in engineering.

For the same reason, I do not find the original case alarming or unfair. If a woman wants to appear in Playboy magazine, by all means do, but you cannot honestly say that wouldn't interfere with her job as a teacher. Image is important, like it or nor. You probably wouldn't look at your boss the same way if you saw him parking cars in the streets during the weekend. More so in the age of information, where our deeds are forever and wherever accessible.

Last but not least, nice picture.


Filipe Baptista de Morais

* Some of them actually had rational explanations to support them, such as the minimum height required, which was justified by the need to lift the luggage up to their place.

Re-match

Two weeks ago I missed out on the Lisbon Marathon due to health issues. That raised to 5 (perhaps more?) the number of races I signed up for and then ended up not running, just in the last couple of months.

While the fees involved are not entirely neglectible, it is the mental stress that concerns me the most when something like this happens. In order to overcome this mental barrier, I've already signed up for five races, the first being this very night and the last one in early December.

None of them, however, is an actual full distance Marathon. With an even score in this dreaded competition (one completed and one dropout), I'm literally itching to prove myself capable of doing it again. And a third time, and every time I so damn please for that matter. Unfortunately, it seems like the next come coming around this western-most side of Europe is only due June. I'll be waiting.

Until then I'll keep collecting lower rank medals. Time goals, as of now, are pretty modest though. Only in the Lisbon Half-Marathon (December) will I actually even try to beat a personal record. Still, I don't consider myself defeated by my former self in any distance range. Be it 10Km, 21Km or 42Km, there will be a re-match. And then another and yet another after that, until I finally renew my time scores. What then? Well, records are meant to be broken. Re-Match.

(December 2013, forgotten in the draft sections until now)

Filipe Baptista de Morais

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Amor de Padre

No passado dia 3 de Março, uma certa notícia do jornal Metro abria com o seguinte cabeçalho "Islamização das Flores preocupa bispos católicos". Isto seria enternecedor, caso se tratasse de simples amor e piedade, tendo os ditos bispos compaixão por tantas almas condenadas à eternidade no Inferno.

Mas, como certamente os mesmos bispos concordariam, tais interpretações literais de textos bíblicos não são verdadeiramente adotada pela Igreja moderna (sim, apesar de intemporal, é necessário re-interpretar a Bíblia ao sabor da História ou, quiçá, da conveniência). Parece então que os tais bispos estão apenas preocupados com a perda de seguidores, o que para um comum agnóstico capitalista é bem mais perceptível. Afinal, seguidores dão tanto dinheiro como prestígio, e todos queremos bater records de likes ou re-tweets. Não deixa de ser interessante, contudo, ver a Igreja Católica a comportar-se como um clube de futebol ou uma cadeia de fast food. Bom, há que apreciar a sinceridade.

Filipe Baptista de Morais

segunda-feira, 17 de março de 2014

24ª Meia-Maratona de Lisboa EDP

No passado Domingo, como certamente deram conta, teve lugar a 24ª Meia-Maratona de Lisboa EDP. Desta vez as inscrições encontravam-se esgotadas, com 27.000 participantes (embora a maioria estivesse inscrita na mini).

E aí começaram os problemas. Chegando ao local da prova "em cima" da hora de partida (cerca de 45minutos antes...) vi-me envolto numa multidão tão densa que foi impossível aproximar-me sequer da ponte. Mal notei quando deram o tiro de partida e, quando cruzei o pórtico de partida e liguei o meu cronómetro, o contador geral marcava já 37minutos de prova.

Mesmo então não se pode propriamente dizer que corríamos, mas antes que prosseguíamos em ziguezague aos saltinhos, tentando desesperadamente arranjar espaço por entre o magote de gente. Numa prova com 24 edições de experiência, e em que se sabe que a grande maioria dos inscritos vai para a prova mais curta andar, não é todo justificável que não haja um acesso a uma zona de partida especial para os atletas da meia-maratona. Como acontece, aliás, na corrida homóloga na ponte Vasco da Gama.

Devo dizer, a jeito de curiosidade, que a maior parte das pessoas em meu redor não parecia de todo incomodada. Excepto um casal de atletas holandeses equipados a rigor que, muito certamente, não voltarão a meter os pés neste país. De resto via-se muita alegria e felicidade, com pessoas de todas as idades a passear em família, por vezes com cães e bebés à mistura. E isto só mostra, mais uma vez, a diferença abismal de público alvo entre os atletas da meia-maratona e (a grande maioria d')os participantes da mini. Seria essencial terem zonas de partida diferentes, se não mesmo horas ou dias.

Devo dizer que a partida foi também retardada pelo acesso muito estreito à ponte, que volta e meia era interrompido por os seguranças terem de interceptar ciclitas ou pessoas que, muito conveniente diga-se, "não faziam ideia" de que era necessário efectuar uma inscrição. Costuma-se dizer que somos desenrascados. Talvez; lata não nos falta certamente.

Também não gostei daqueles que aproveitaram o evento para fazer política e/ou propaganda para outros fins. Não gosto mesmo de ser fotografada/filmado junto de pessoas aos berros exibindo cartazes com os quais não me identifico e/ou não escolhi apoiar. Além de que cada evento tem o seu propósito, e não é de bom tom tentarmos utilizar todos em nosso proveito.

A partir do 4º ou 5º Km (6º ou 7º reais, se contarmos o caminho até à partida e todos os Ss...) separavam finalmente as águas, e de repente a estrada encontrava-se vazia. Conseguimos então finalmente correr um bocadinho a um ritmo constante.

Infelizmente a minha parceira de corrida começou a sentir uma pontada no joelho pouco depois, pelo que a deixei na curva perto do terreiro do paço, mesmo antes do 8º Km, e prossegui então sozinho (já sei, sou uma pessoa horrível). Acelerei então dos cerca de 6min/Km (um pouco mais lentos até devido às circunstâncias complicadas) para volta dos 4min30s/Km, que mantive quase até ao final. Nos últimos 2Km abrandei significativamente, mais por falta de motivação do que por cansaço.

No final deram a medalha da praxe (uma prática que felizmente escolheram manter!) e um gelado ateatório. As tão apregoadas bananas da madeira já tinham esgotado.

O melhor estava para vir. Apanhei o eléctrico em Belém de volta para Lisboa, mas este apenas foi até Santo Amaro de Alcântara. Esperei noutra paragem mais em frente uns 5minutos por outro veículo, mas ao ver que o placard teimava em anunciar que este ia demorar mais um minuto (será que ainda falta um minuto?) desisti e comecei a encaminhar-me a pé. Ainda vi passar um 728, mas vinha apinhado e não saíu ninguém; impossível entrar. Vim portanto até ao Cais do Sodré, meio a correr meio a andar, sem ver passar mais nenhum autocarro ou eléctrico. Excelente organização não haja dúvida.

De positivo deixo apenas os abundantes e bem abastecidos postos de apoio, a medalha e a T-Shirt (muito gira). Não fique com grande vontade de voltar para o ano.


Filipe Baptista de Morais

segunda-feira, 10 de março de 2014

Cooperação

A Carris tem agora em curso uma campanha de combate à fraude, pedindo (ou urgindo?) os utentes a abrirem os olhos e combaterem a fraude. A comunicação pode, a meu ver, ser interpretada de dois modos bem distintos: um primeiro algo negativo e um outro de saudar, que acredito ser a verdadeira intenção por detrás da mensagem.

Por um lado podemos ver nas palavras e na imagem (um grande par de olhos, qual Big Brother) um incentivo ao vigilantismo e à denúncia. Não creio ser disso que necessitamos.

Mas também podemos ler na frase um apelo à reflexão e à conciencialização. Há demasiada gente que acredita verdadeiramente que não pagar um bilhete não prejudica ninguém. Há demasiado tempo que consideramos que tudo o que "damos" ao Estado é roubado, enquanto que tudo aquilo que ele nos "dá" é devido e peca por defeito.

Penso que a campanha seria mais eficaz se apresentasse números concretos. Eu, pelo menos, gostaria de ler algo como se a fraude nos transportes fosse reduzida para metade poderíamos baixar o preço dos bilhetes em x €. Talvez algo semelhante venha a acontecer na 2ª fase da campanha, a ter início já na quinta-feira segundo esta notícia. A mesma fonte adianta também alguns números, como a taxa média de fraude na Carris (15.2%). São números demasiado pesados. E não podem ser devidamente  aliviados com maior vigilância, sob pena de nos vermos a braços com encargos ainda mais pesados ou de cairmos no autoritarismo. Não; temos mesmo de cooperar.

Da parte do estado e das empresas, contudo, há também muito que poderia ser feito. É ridículo, por exemplo, que um portador de passe não o possa carregar num autocarro, tendo de comprar um (caro) bilhete simples para depois o carregar posteriormente. Mas não podemos usar essas falhas como escudo para o nosso comportamento. Cooperemos.


Filipe Baptista de Morais

sábado, 1 de março de 2014

De Nada

Ontem, como quase todos os dias, esperei pacientemente no início da passadeira junto à rotunda de Cabo Ruivo que um carro abrandasse a sua marcha antes de me fazer à estrada e, com um leve aceno de cabeça, agradecer a gentileza.

Contudo, desta vez ocorreu-me que o agradecimento não era adequado à situação. Afinal, o condutor não havia feito mais do que a sua obrigação. Faria mais setnido gritar e rabujar com todos os outros que não o haviam feito em primeiro lugar.

Percebi, algo triste mas não surpreendido, que essa atitude (que não é, de todo, da minha exclusividade) não é apenas produto da educação e personalidade. É antes uma demonstração do quão habituados estamos a que as regras não sejam obedecidas, mas antes constantemente testadas, deturpadas e desrespeitadas. Tanto pelos outros, como nós próprios. Somos, de facto, bastante desenrascados quando se trata de contornar este ou aquele "entrave".

Porquê? Para benefício próprio, seria a primeira e mais óbvia resposta. Mas não creio que seja muito verdadeira. Não somos pessoas horríveis; pelo menos não mais que todas as outras. Antes parece que, como fãs dedicados a discutir futebol, temos alguma pala que nos impede de ver o alcance das nossas acções e atitudes. Escudamo-nos com desculpas tão fáceis como falsas ou erradas, como "toda a gente faz isso", "uma pessoa não vai fazer a diferença", "não faz mal a ninguém", "é roubar aos ricos  para dar aos pobres", "eles é que provocaram isto".

Sempre achei que devemos viver de modo a poder pensar, algo arrogantemente, que se mais pessoas fossem como nós o Mundo seria um lugar melhor. Ou, de certo modo, equivalente, que devemos encarnar a transformação que queremos ver no Mundo. Não nos devemos reger ou medir por médias ou medianas, ainda para mais tão frequentemente mal calculadas. Se todos são maus, alegremo-nos: assim é tão mais fácil fazer melhor.


Filipe Baptista de Morais

sábado, 22 de fevereiro de 2014

(Não) Esquecer

Há uns meses o jornal Metro publicou uma entrevista com o actor Jake Gyllenhaal, em que este confessava um dos seus maiores receios na vida: perder oportunidades. É um medo legítimo e partilhado por muitos, já que hoje em dia somos bombardeados com tantas escolhas (leia-se oportunidades) que é impossível não falhar algumas. Já para não falar daquelas que apenas surgem quando as procuramos.

Talvez por isso mesmo tento olhar para a questão de outro ângulo, que não dá azo a receios: já que as oportunidades são tantas, mesmo perdendo uma grande parte delas conseguimos ter uma vida preenchida e realizada. Os meus receios são outros, e provavelmente advém da minha memória extremamente selectiva e caprichosa. Mais do que perder oportunidades,receio esquecer-me das que agarrei. Isto porque quando perdemos uma memória, quando esquecemos uma palavra, uma acção, uma pessoa, para todos os efeitos ela nunca existiu. Passado, presente e futuro, todos perdidos em simultâneo devido a uma memória mal arrumada.

Quando era mais novo tinha episódios de sonambulismo. O mais interessante (e assustador) do sonambulismo é que o próprio, ao acordar, não se recorda de nada do que fez. Por vezes interrogo-me como seria acordar um dia sem qualquer memória. Toda uma vida perdida. Os nossos amigos e conhecidos contar-nos-iam histórias de quem éramos, mas acreditaríamos neles? Ainda que o fizéssemos, conseguiríamos ligar-nos a esse personagem estranho que fomos, desvendar os seus actos e intenções? Creio que não, e que essa perda significaria um verdadeiro renascer.

Talvez ainda mais interessante seja pensar no impacto que isso teria na vida dos outros. Os nossos amigos, por exemplo; continuariam a sê-lo quando não mais nos ríssemos das private jokes, partilhássemos recordações de viagens, tivéssemos conhecidos em comum? Ou a nossa namorada. Continuaria a sentir a mesma intimidade ao saber que esquecemos todos aqueles momentos? Melhor ainda, continuaria ela mesma a dar-lhes importância ao saber que ninguém os partilhava? Não seriam muito diferentes de alguma alucinação ao delírio.

Somos as nossas memórias, e as que os outros têm de nós. Não é por acaso que fotografamos os momentos mais importantes das nossas vidas. Outras coisas tentamos pô-las por escrito, garantindo assim a sua sobrevivência. Já os nossos antepassados procuravam a eternidade nos anais da História. Nem todos podemos viver para sempre, no papel e nas memórias dos outros, mas certamente que devemos tentar fazê-lo pelo menos enquanto respiramos.


Filipe Baptista de Morais

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Corrida dos Namorados

A Câmara de Lisboa teve este ano uma iniciativa para comemorar o dia dos Namorados de uma maneira um pouco diferente: uma corrida em formato estafeta (6km+6km), sendo as equipas constituídas por pares de namorados.

O evento teve lugar no parque das conchas, um dos espaços verdes mais bonitos de Lisboa. O tempo colaborou (dentro dos possíveis), brindando os atletas com um frio sem chuva. O percurso era simpático, tendo a organização optado por evitar a maior parte dos altos e baixos do parque. De negativo apenas o facto de se repetir, tendo cada um dos atletas de completar duas voltas (iguais) de 3Km.

Provavelmente devido a uma série de noites mal dormidas fiz um tempo um pouco acima daquilo que pretendia, terminando em 32º dos masculinos com 23m28s. Curiosamente, a minha equipa acabou por terminar também em 32º da geral, com 57m22s no acumulado.

Uma prova engraçada pela originalidade, ainda para mais com a vantagem de ser à tarde, poupando os atletas a um já habitual despertar matutino ao fim-de-semana.

Em termos de organização, não há muito a apontar. Dada a curta distância não existiam postos de abastecimento, o que é perfeitamente compreensível. Já a falta de marcos a cada quilómetro foram, para mim, uma falha importante. Assim como a falta de medalhas de recordação para os participantes (começam a ser raras as provas que as entregam...). A zona de passagem de testemunho também pecava por alguma confusão, tanto pelo fluxo de pessoas a correr em todas as direcções (havia várias curvas nas redondezas) como pela insistência algo estranha de anunciarem ao microfone os números das equipas que iam cruzando a meta a cada volta. Tudo facilmente desculpável pela falta de espírito competitivo da prova. Ainda que houvesse várias equipas de atetlas profissionais, que "limparam" sem grandes problemas os prémios devidos aos primeiros lugares.

All in all, uma prova divertida que é provavelmente para repetir. Penso apenas que seria mais interessante se os atletas masculinos, após completarem a sua prova, tivessem de acompanhar a atleta respectiva na sua prova. Que foi o que muitos de nós acabámos por fazer de qualquer modo, pelo menos em parte do percurso.


Filipe Baptista de Morais

Mau Gosto

Uma notícia do jornal Metro da passada quarta-feira tinha o seguinte cabeçalho "Um tutor de terroristas suicidas queimou etapas, sem querer, e explodiu a sua classe numa aula prática". Não me considero uma pessoa particularmente sensível a estas coisas, mas achei a abordagem de extremo mau gosto.

Claro que, se surgisse numa crónica do Ricardo Araújo Pereira, provavelmente me riria com gosto. Mas há uma grande diferente entre uma crónica de entretenimento e uma notícia. A primeira tem de gozar de uma certa libertinagem, sem a qual qual sentido de humor sufoca e apodrece. Já a segunda deve pautar pela objectividade e evitar trocadilhos e outras formas baratas de chamar a atenção.

Terroristas ou não, morreram vinte e um jovens (mais o intrutor). Jovens esses que estavam dispostos a dar a vida por uma causa. Pode ser uma causa criticável e incompreensível, e os seus meios de a atingir ainda mais, mas o facto de se disponibilizarem para o fazer não deixa de ser em si só extremamente triste. Sejamos francos. Podemos chamá-los de loucos e de más pessoas, olhando repudiados do alto do nosso pedestal. Mas a verdade é que não é por acaso que em certas regiões do globo proliferam este tipo de terroristas, enquanto noutras proliferam aqueles que os desprezam (ie: nós). Tivéssemos nascido uns graus mais a leste, talvez fossemos nós a pronunciar cânticos de guerra e a morrer ao "queimar etapas". Isto não deve servir para desculpar os seus actos. Nem para os compreender, que felizmente permanece um exercício para lá do nosso alcance. Antes deve servir para nos relembrar daquilo que dizemos mais nos distanciar deles: o respeito pela vida humana.


Filipe Baptista de Morais

domingo, 9 de fevereiro de 2014

Para Sempre (por enquanto)

Ontem, ao levar a cabo mais uma profunda (sentido literal) arrumação da minha secretária, deparei-me com montes de pedacinhos do passado, perdidos e espalhados por aí, a maioria dos quais foi direitinha para o lixo.

Não pretendo com esta introdução ilustrar a desarrumação habitual da minha secretária/armazém, mas antes reflectir um pouco sobre a efemeridade. É que muito desse lixo, na sua maioria papéis, foi já extremamente importante para mim. Artigos que estudei para a minha tese, lembretes que não podia de maneira alguma esquecer, planos de viagens que já realizei ou das quais acabei por desistir. Tudo isto me prendeu a atenção no passado, para agora não merecer mais do que uma vistoria rápida antes de ir parar ao caixote.

O que é interessante é que raramente ou nunca nos apercebemos do quão pouco aquilo que nos consome agora nos vai importar no futuro. Seria engraçado se, por alguma arte mágica, pudéssemos dar uma espreitadela ao futuro e assim relatizar a importância das coisas. Tal viagem não teria, provavelmente, um final feliz. Afinal, como poderíamos dedicar-nos a algo que sabemos que daqui a anos, meses, ou dias nos vai aborrecer ou mesmo repudiar? E como ignorar algo que sabemos ser uma futura obcessão? Os nossos interesses, gostose paixões terão sempre de ser encarados e tratados como algo estático, imutável, sob pena de se perderem por completo. Só assim podemos falar de eternidade, que na realidade existe apenas no presente.

Seria bonito, algo poético até, que isto apenas se aplicasse a objectos e não a pessoas. Infelizmente, não creio que seja esse o caso. Lembro-me de, em pequenino, passar os intervalos da escola a limpar árvores com os meus dois melhores amigos. Sim, houve uma altura em que tinha uma fofinha veia ecologista. Mas não é sobre isso que estamos a falar agora. O que importa ver aqui é que, na altura, essas pessoas assumiam para mim igual importância e, se me perguntassem,, certamente diria tratarem-se de amigos para a vida. Pouco tempo depois um deles (uma rapariga) mudou de escola. Nunca mais a vi nem falei com ela. De facto, hoje retenho apenas uma memória difusa e porventura falaciosa, que recordo apenas quando, como neste momento, me ponho a desenterrar o passado.

É certo que na altura era bem mais criança. Mais volátil e imprevisível. É certo que não usava telemóvel nem e-mail. Mas culpar o desenrolar dos acontecimentos nesses substratos físicos está errado e é redutor. A verdade é que nãao sabemos se as coisas e pessoas que nos são queridas ainda nos irão imporar amanhã.

Esta desculpa de dizermos que essas mudanças provêm do facto de antes não estarmos ainda completamente desenvolvidos é recorrente, e daqui a 20 anos usá-la-emos novamente, desta vez apontada ao nosso eu de 2014, podendo continuar a usá-la toda a vida sem que nos apercebamos da falácia.

De facto, não gosto quando as pessoas reconhecem os seus erros (ou virtudes) passados, dizendo que o tempo as ajudou a relativizar as coisase que agora fariam tudo de maneira diferente. O que o tempo nos traz é uma nova perspectiva, não necessariamente melhor que a anterior. E para relativizar, ou talvez fizesse mais sentido dizer desrelativizar, teríamos de pegar em todas essas perspectivas percorridas ao longo dos tempos e, de algumo modo, integrá-las numa só, mais sólida e sábia. Mas isso nunca poderemos fazer, pois todas essas anteriores perspectivas nos escapam agora, e ao tentarmos repescar essas velhas lentes o que estamos de facto a fazer é pô-las à frente, ou atrás, das que usamos de momento. Para mais, é duvidoso que tenham resistido ao passar dos anos sem risco.

Para não concluir de forma triste, gostaria de salientar que isto não significa que nunca possamos prometer para sempre. Antes pelo contrário. Significa que podemos fazer tais promessas, e cumpri-las, ainda que as descartemos já amanhã.


Filipe Baptista de Morais

domingo, 2 de fevereiro de 2014

Trail de Bucelas


Após a arrancada da temporada no último Domingo em Sintra, hoje somei mais 25Km (e dos bons!), desta vez na zona de Bucelas.

Uma prova de trail muito interessante, e bem à saída da cidade. Desengane-se quem julga que tem de andar muitos quilómetros de carro para encontrar lindas paisagens bucólicas e trilhos aventureiros. É também uma prova dura, já que apesar de não ter chovido não falou lama escorregadia (duvido que alguém tenha terminado a prova sem o rabo enlameado), subidas impossíveis e descidas assustadoras e, claroa travessia de um riacho. Como ainda não tenho uns ténis de trail e não queria estragar os meus amados ténis de prova de estrada levei um par já velhinho que encontrei para aqui, e que geralmente já só servia para jogos de paintball. Creio que vai direitinho para o lixo.

Uma prova também pautada pela boa disposição e ambiente pouco competitivo e amigável, tanto da parte dos outros atletas como da organização. Percorri-a nas calmas a acompanhar um amigo, andando nas subidas e correndo devagarinho nas rectas e descidas (enquanto as pernas o permitiram pelo menos), terminando em umas humildes quatro horas e meia. Os postos de abastecimento estavam bem distribuídos e equipados, com bananas, laranjas e bolachas.

Fiquei com pena de não me ter inscrito para o almoço, para ficar a conhecer também a comida da vila (que cheirava muito bem tenho de dizer), assim como o vinho.

De negativo apenas tenho a apontar a falta de água no último abastecimento (ie: na verdade tinham água, mas falta de copos para a distribuir), o facto de a T-Shirt da prova não ser técnica e, mais uma vez, o não atribuírem uma medalha aos participantes. Parece que isto, infelizmente, é uma moda que está a pegar. Bem, se calhar vou ter de passar a coleccionar outra coisas. Selos, quiçá.

Para o ano devo lá voltar.


Filipe Baptista de Morais

sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Geração apenas

Acabei de ler aqui uma crónica intitulada "Geração ziguezague". A nossa geração deve ser, é preciso dizê-lo, de facto notável, e acumula títulos desde tenra idade. Geração à rasca, geração rasca, geração ziguezague... será que não se cansam de nos tentar rotular a todos com a mesma etiqueta? Ainda mais puxando sempre pelo negativo, seja das nossas pessoas ou do nosso (negro parece) futuro.

Devo dizer que não me reconheço, nem à "minha geração" (se é que faz algum sentido usar tal termo), nas palavras desse texto. Penso que fomos provavelmente a geração de Portugueses que mais incentivada foi a seguir os seus sonhos.

Também não me (nos?) reconheço no estereótipo da geração rasca. Isto provavelmente diz tanto das minhas idiossincrasias como da futilidade do esforço de caracterizar milhares ou mesmo milhões de pessoas com o mesmo objectivo. Cada um de nós teve um berço, educação, vivências e experiências únicas, pelo que não há qualquer motivo para esperar que agora fossemos todos iguais. Se somos de facto uma geração, somos uma geração apenas.

domingo, 26 de janeiro de 2014

Grande Prémio Fim da Europa

O início do ano já lá vai e começava a arrastar-se o início da época de atletismo. O Grande Prémio Fim da Europa surgiu assim como a prova perfeita para terminar esse já longo jejum.

À semelhança da edição de 2010 a chuva, o vento e o frio não quiseram ficar de parte, apesar de numa intensidade bem inferior e mais simpática. Já o sono, esse sim fez-se sentir dolorosamente. Mas tudo isso fica esquecido perante a bela (e inclinada!) serra de Sintra envolta na sua característica neblina.

Fiz a prova sem grandes preocupações competitivas, mantendo uns confortáveis 7m30s/Km nas subidas mais íngremes, 5m30s/Km nas descidas e por volta de 6m/Km nos escassos troços planos.

Penso que a beleza do troço final até ao Cabo da Roca por si chega para convencer todos os participantes a madrugarem novamente para o ano. Não é por acaso, aliás, que esta prova esgota sempre rapidamente as inscrições.

Falando agora da organização, de salientar as marcas em todos os quilómetros e os postos de abastecimento bem situados e guarnecidos de pessoal. Pela negativa apenas o facto de o último marco estar descaradamente mal colocado (ou a distância anunciada errada por uns bons 500m), a falta de medalha de recordação para os atletas (esta nunca posso deixar passar) e a espera algo demorada pela partida dos autocarros de volta para a zona da partida. Mas talvez esta última seja inevitável, excepto se fechassem o circuito, tornando a prova nuns duríssimos ~30Km que certamente muitos dos atletas hoje presentes teriam dificuldade em completar.

No final da prova, e devido a um "wrong turn", acabámos a tomar café e pedir indicações numa churrasqueira (cheirava bem que se farta! e a fome também já era muita...) cujo dono se veio a revelar um ex-vencedor da prova com uns espantosos 53mins. Eu dou-me por satisfeito com os meus 1h41m54s.

sábado, 4 de janeiro de 2014

Praxe

Há muito tempo que tinha em mente (e em diversas listas de lembretes dispersas por vários aparelhos e formatos) escrever um texto sobre as praxes académicas. Sendo um tópico algo sensível e a minha opinião em relação a ele algo impopular, fiquei assim bastante satisfeito ao deparar-me com este texto, que espelha muitas minhas convicções. Infelizmente ainda não tive oportunidade  de assistir ao referido documentário Praxis, o que está sem dúvida na minha to do list.

Antes de entrar em pormenores devo acrescentar que não gosto particularmente do programa de comentário político (Eixo do Mal?) através do qual o autor Daniel Oliveira é bastante conhecido. Talvez por isso mesmo tenha ficado tão feliz por me identificar com a maioria das suas palavras em relação a este tema. É sempre bom sermos relembrados que as pessoas, e o mundo em geral, são entidades complexas que não podem ser classificadas segundo um simples sistema binário.

Para terminar esta introdução queria apenas dizer que não me revejo no último parágrafo do artigo, onde creio que o autor se excedeu nas conclusões. Mas prossigamos.

As praxes vêm constantemente a sua existência ser justificada por duas razões distintas: a tradição e a ideia de que são um instrumento de integração. Á primeira nem vou dedicar qualquer tipo de atenção, já que argumentos de género sempre foi assim me passam bem ao lado.

Quanto à integração, há muito que pode ser dito. Penso que a primeira questão a colocar é se a praxe é realmente necessária à integração na Universidade. A meu ver a resposta é um rotundo não. É verdade que ainda retenho alguns amigos que conheci nas praxes, mas fiz muitos mais posteriormente. Penso que o se mesmo se passará com a maior parte dos universitários.

Pondo a questão da necessidade de lado vale a pena olhar para os métodos utilizados. Considerando que o fim das praxes é a integração dos novos colegas, será que o conteúdo destas é o mais adequado? Aqui já me faltam os adjectivos para acentuar o que não que se impõe. Certamente que há jogos, festas, desportos, actividades em geral que permitam a integração sem recorrer à degradação, humilhação e submissão que as praxes implicam. Aqui estou totalmente de acordo com o Daniel Oliveira: as praxes servem mais para os veteranos exercerem algum tipo de poder arbitrário do que para os caloiros obterem algum tipo de benefício. É de facto espantoso como ano após ano isto é bem aceite pela generalidade dos estudantes. Não conhecia a citação de Sartre (é sempre fácil obedecer quando se sonha comandar) e arrepia-me pensar que esta talvez se adeque de facto ao caso.

Certo que a praxe é optativa (pelo menos na Universidade por que tive o prazer de passar). Mas, se as suas capacidades de integração são dúbias e desnecessárias, o seu poder de exclusão é real e inescapável.

Gostaria também de comentar esta passagem: Porque a integração não é obrigatoriamente positiva. Se ela nivela por baixo deve ser evitada a todo o custo. Penso que isto de facto acontece com as praxes. Não só pelas razões já abordadas acima (no manuscrito na realidade é ao lado, que as páginas são pequeninas), embora estas dominem em questões de importância, mas também em termos académicos. E faz sentido falar em termos académicos visto tratar-se da inclusão numa Universidade. As praxes são uma primeira e excelenete oportunidade para os recém-chegados conviverem com os mais experientes veteranos, recebendo avidamente todo o tipo de conselhos e experiências (já não falo de ordens). Acontece que (e aqui falo tanto por experiência própria como alheia) as comissões de praxe, seja pelo tempo que requerem atrair a fauna mais bem sucedida (em termos académicos), levando a conselhos de utilidade duvidosa. Na verdade nestas épocas domina aquilo estranho espírito académico que parece acreditar que desfrutar a vida implica necessariamente um fraco desempenho académico, chegando a olhar com um certo desdém para os que obtém bons resultados.

Há ainda outra questão que eu considero da maior importância, que são os casos extremos. Todos os anos há excessos nas praxes, resultando em violações, acidentes graves e/ou abusos que levam a traumas físicos e psicológicos. É verdade que estes não reflectem o espírito das praxes (seja o suposto seja o verídico), e que 99.9% das pessoas que as praticam sem dúvida repudiam tais actos. Mas o facto é que as praxes fornecem o enquadramento de poder e submissão que propicia esse tipo de acontecimentos. Dadas as suas curtas benéces, isto só por si seria a meu ver razão suficiente para abandonar esta prática.


Filipe Baptista de Morais