quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

O porquê do porquê

Há uns tempos li um texto que apregoava a existência de dois tipos de escritores, os que precisam de escrever e os que precisam de ser lidos. Depois lançava-se numa longa e imaginativa descrição dos dois, sendo que o primeiro se caracteriza essencialmente por uma extrema timidez e insegurança, enquanto que o segundo transpira arrogância e certezas. Pessoalmente não me identifico com nenhum dos dois, o que faz sentido já que dificilmente poderei ser considerado um escritor.
É claro que etiquetar milhões de pessoas em apenas duas classificações diferentes é um tremendo disparate. Felizmente as pessoas são mais complexas e interessantes do que isso. Esta patética tentativa não merece então muita atenção, visto o absurdo das suas assumpções. O que pode aqui ser merecedor de escrutínio é algo mais subtil, a tentativa de justificar desejos subconscientes.
Dizer que escrevemos porque precisamos sub-conscientemente de o fazer ou de ser lidos é necessariamente fruto de uma observação exterior, uma opinião se assim o quisermos, não por isso menos válida; a vida não é um problema de Matemática. Tentar explicar essa explicação já é uma dor de cabeça muito maior. Interpretar uma necessidade subconsciente parece uma tarefa impossível à partida, já que o seus resultados não são visíveis; não se trata de interpretar uma acção. Claro que se pode empregar ferramentas de análise empíricas e/ou estatísticas, mas estas podem revelar-se perigosamente ambíguas a estabelecer relações de causalidade. Mais, visto que o que podemos ver são as acções e daí pressupor o estado emocional do agente, corremos o risco de nos ver embrenhados numa cadeia de erros não tão curta assim. Penso por isso que não devemos esticar a corda. O porquê das coisas é mais do que suficiente para nos ocupar durante uma vida. Deixemos o porquê do porquê para os filósofos.

Filipe Baptista de Morais

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