quinta-feira, 1 de maio de 2014

Assistência Justa

Em Portugal fala-se muito no conceitor de fair-play, quase sempre associado ao futebol, esse rei que tanto tempo nos ocupa nos noticiários. Embora muitas vezes associado ao combate aos comportamentos racistas, o fair-play é na realidade um conceito que praticamente se abstrai dessa temática. Traduzindo à letra obtemos algo como jogo/jogada justo/a, enquanto que o termo mais comum para o substituir é simplesmente desportivismo. No fundo consiste em jogar o jogo sem artimanhas, sem recorrer a nenhuma vantagem deslear e/ou não permittida. Abrande assim métodos como o doping no ciclismo, o esticar os dedos no final de um soco (para estes atingirem os olhos do adversário) nalguns desportos de combate, e as faltas dissimuladas e os mergulhos para a piscina no futebol.

Penso ser agora totalmente claro que vejo o fair-play como algo transversal a todos os desportos. Mas, mais importante e talvez não tão óbvio, considero-o aplicável não apenas aos jogadores, mas a todos os intervenientes. Assim, um árbitro que tome (consciente e propositadamente) uma decisão incorrecta está a ter falta de fair-play, assim como um dirigente de um clube que tente exercer sobre um organismo desportivo ou um médico que forneça substâncias ilegais aos atletas a seu cargo.

Após esta (longa) introdução queria apenas deixar um pequeno desabafo a respeito de uma grave falta de fair-play que presenciei hoje no centralito, um dos courts onde se disputa o Portugal Open. A partida era entre Gastão Elias e Garcia-Lopez, um atleta Espanhol. O público, claro, apoiava em massa o atleta da casa, aplaudindo-o e puxando por ele, nos bons mas também (algo supreendentemente) nos maus momentos. Isto é bonito de se ver.

Aplaudir erros do adversário é que já é algo que me custa a engolir. Aplaudir faltas no serviço, assim como duplas faltas, parece-me estranho e de mau gosto. Fazer barulho durante o acto de serviço (movemento que requer extrema precisão e coordenação, logo também concentração) é inaceitável. Pior que tudo, foram os muitos assobios e vaias que o atleta Espanhol teve de ouvir ao pedir ao árbitro para verificar uma marca que acreditava comprovar uma má chamada da equipa de arbitragem. O árbitro desceu da cadeira, verificou a marca, e deu-lhe razão; o público explodiu em apupos. Que quer isto dizer? Que queremos que o nosso atleta vença ainda que à custa de más decisões de arbitragem?

Várias destas explosões de falta de fair-play afectaram e desconcentraram claramente Gracia-Lopes, prejudicando sem dúvida a qualidade do seu jogo. A sua irritação para com o público era, aos meus olhos, tão visível como justificada. Não quero com isto tirar qualquer mérito a Gastão Elias, que jogou a sua partida e venceu-a com todo o mérito. Quero apenas deixar uma crítica veemente aos adeptos que incidem neste tipo de comportamentos.

Infelizmente não é a primeira vez que vejo este tipo de comportamentos nesta competição. Cheguei a ver, inclusivé, um jogador a ser vaiado ao erguer a taça de vencedor da competição. Triste. Não sei porquê, mas imagino sempre os tele-espectadores de um jogo de futebol no bar da esquina, a embocar cerveja enquanto petiscam uns tremoços. Já aos de uma partida de ténis, costumo imaginá-los a saborear um whisky velho no bar do hipódromo. Talvez seja apenas uma parvoíce. Mas também pode bem ser que o fair-play não se encontre num casaco e gravata.


Filipe Baptista de Morais


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