segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Longe da mente, longe do coração

Todas as nossas acções, são no fundo, reacções a outros acontecimentos que as precem. E podem ser fruto de uma extensa reflecção ou, em oposição, uma reacção puramente espontânea. As mais ponderadas tendem a ter resultados semelhantes ao esperado, o que é relativamente bom quando as expectativas são altas, e relativamente mau quando não o são. Saliento o relativamente pois parece-me que, ao perderem o efeito surpresa devido ao excesso de planeamento é-lhes retirada muita da chama e intensidade que poderiam ter de outro modo. Associo assim muito mais a espontaneidade às emoções fortes, quanto mais não seja pela "adrenalina" do inesperado. Já Fernando Pessoa falava do disciamento (e confronto) entre o pensar e o sentir, embora em termos um pouco diferentes.
Parece-me que o "problema" da racionalidade reside na capacidade de perspectivação temporal, tanto para o passado como para o futuro. É facilmente perceptível e aceitável que, ao dispersarmo-nos peloes três espaços temporais, nos impedimos de viver em pleno o presente. É como se não estivéssemos concentrados naquilo que acontece, pensando no que aconteceu, poderia ter acontecido ou poderá vir acontecer.
Creio que é esta a razão que torna o alcóol e as substâncias alucinogénicas tão apelativas em momentos de diversão. Elas "soltam-nos", libertam-nos da racionalidade que nos prende as acções com medo das consequências, o que geralmente é maravilhoso. Mas também pode ser desastroso, uma vez que a falta de perspectivação futura nos pode levar a fazer coisas realmente estúpidas.
É ainda interessantes reflectir no que nos resta quando privados da racionalidade. Há quem diga que é aí que se revela o verdadeiro "eu", e daí sermos mais "verdadeiros" quando ébrios e assim. A mim parece-me que esta é uma perigosa confusão entre os conceitos de honestidade e veracidade. Uma não implica a outra, nem a exclui, pelo que quase se pode dizer que nada têm em comum. Acredito que nestas situações nos encontramos privados de algo essencial à nossa condição ou definição, e que estamos de facto a substituir a nossa essência (os nossos pensamentos) por algo que lhe é alheio, meros estímulos exteriores. Daí sermos mais imprevisíveis e irreconhecíveis quando irracionais.
Para terminar, lanço o comum e modesto apelo que me iliba de qualquer aparente tentativa de desencaminhamento, "se conduzir, não beba".

Filipe Baptista de Morais

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