domingo, 23 de novembro de 2014

Selecção Artificial

Recentemente li uma reflexão interessantíssima n'Observador sobre os critérios de admissão à faculdade. Estes raramente são debatidos ou postos em causa e, quando o são, geralmente é com o intuito de sugerir pequenas alterações, nomeadamente na proporção devida às notas do secundário e aos exames nacionais.

O esquema actual é, na minha opinião, tremendamente injusto. Por um lado, coloca bastante peso numa única prova, que ainda por cima nem tem direito a revisão presencial. Por outro está sujeita à enorme variabilidade da exigência entre escolas.

Em relação a esta última devo dizer que, ao contrário do que parece ser a opinião do cronista d'Observador, não creio que o principal problema seja o inflaccionamento consciente (pela positiva) de notas no privado. Penso que a falta de exigência de muitas escolas (em ambos os regimes) ou, se preferirmos, os diferentes graus de exigência e/ou as diferentes políticas classificativas das escolas são já em si enormes e suficientes para tornar o actual sistema extremamente injusto.

Há outros, claro. Muitas Universidades americanas entrevistam os candidatos, seleccionando-os como se de um emprego se tratasse. Ao ler o texto acima referido aprendi que na Alemanha é requisitado aos alunos cuja nota no exame nacional seja muito díspar em relação à da escolha que repitam o exame.E que em França podemos entrar (sem selecção) no curso que queremos, sendo a própria Universidade a realizar a selecção ao fim de um ano.

Dos esquemas mencionados parece-me ser mais justo o francês, embora seja claramente pouco eficiente. No entanto, penso que teríamos muito a ganhar ao aumentar os poderes/deveres das faculdades naquilo a que a escolha dos candidados diz respeito.

Quero acrescentar, também,  que vejo nos problemas de admissão ao ensino superior um mero sintoma de um mal maior. Mal este que se estende por todo o tipo de selecções  na funcção pública, seja a colocação de professores, a prova nacional de seriação dos médicos ou os concursos públicos. Creio que, no receio de que os processos sejam susceptíveis de favorecimentos da parte de agentes corruptos nos esforçamos demasiado por encontrar uma fórmula mágica, totalmente impessoal e determinística, que nos permita seriar os candidatos sem qualquer input da parte das instituições. E assim inventam  um qualquer exames, ou um qualquer processo que nos permita atribuir um número (e.g: nota) incontestável a cada pessoal. O problema é que esses números nunca podem reflectir totalmente nem as capacidades dos candidatos, nem as necessidades das instituições (até porque estas últimas são plásticas). E, no receio obcessivo de que um ou outro gato pingado seja favorecido, acabamos por eleger sistemas que são injustos para toda a gente. Penso que são muitas as áreas onde a descentralização, leia-se, o aumento da autonomia e dos poderes de decisão llocal relativamente a estas matérias traria mais justiça e, também, melhores resultados.


Filipe Baptista de Morais

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