domingo, 2 de setembro de 2012

Não és o único

Há dois meses apareceram umas estatiscazinhas engraçadas num telejornal cujo nome não me vou referir, tanto por indiferença como por desconhecimento. Eram referentes à empregabilidade de diferentes cursos superiores, analisando quantos dos recém-formados nos últimos anos se encontram presentemente desempregados.

O lugar de destaque no pódium era ocupado pelo curso de Engenharia Electrotécnica e de Computadores do Instituto Superior Técnico (Lisboa). Aparentemente, dos engenheiros saídos desse molde nos últimos anos apenas um se encontra desempregado. Sim, apenas um. Isto dá azo a todo tipo de engraçadas especulações intrusivas. Será um incompetente? Será simplesmente azarado? Será que estava em casa deprimido a ver a reportagem e se suicidou ao ver que está sozinho? Ou será que é antes rico e não precisa nem quer trabalhar; ou antes um crítico do actual estilo de vida capitalista e consumista que decidiu ir viver na floresta em harmonia com a Natureza. Provavelmente nunca saberemos. Mas as estatísticas não deixam de ser animadoras para os seus futuros colegas de profissão.

Não acredito, no entanto, que esse personagem esteja de facto sozinho na sua condição. Para além de eventuais "erros" nos procedimentos que, obviamente, desconheço, creio que também é importante ter em conta a qualidade do emprego. Por qualidade não me refiro às tão badaladas condições de trabalho precárias a recibos verdes, visto que até há quem prefira trabalhar nessas condições. Refiro-me antes à satisfação pessoalmente relativamente às suas funções. Isto é, não me espantava que muitos desses engenheiros que fugiram ao desemprego estejam num McDonalds ou num Call Center. Ou no estrangeiro, apesar de não o desejarem. Não é a mesma coisa que estar no desemprego, claro, mas também não era certamente aquilo que tinham em mente quando puseram a cruz lá na caixinha. Por isso calma, colega, que não estás só.

Espero ainda que isto não sirva para incitar, ainda mais, os pais a empurrarem os seus filhos para longe das artes e humanidades. Devemos ser realistas, sim, mas não derrotistas e conformista ao ponto de desistirmos dos nossos sonhos, de tentarmos ser quem queremos. Senão tornamo-nos um bando de Zombies sem propósito, presos na mediocridade da tristeza.


Filipe Baptista de Morais

2 comentários:

  1. Numa sociedade onde "tudo é possível" e onde vigora a ideia de que toda a gente pode ser qualquer coisa (basta olhar para os títulos dos livros), o ónus é maior sobre quem não consegue. Não admira que, segundo a OMS, a depressão se esteja a tornar a segunda causa de incapacidade.

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  2. Sim. No outro dia tive uma conversa muito interessante com a minha empregada, em que ela me disse que nós (a tão chamada "geração à rasca) não fazíamos ideia do que era viver no tempo dela, nem do que é realmente estar à rasca. Mas que ainda assim sentia pena de nós, porque eles nunca sentiram a falta de nada enquanto que nós seríamos uns infelizes por termos crescido a sonhar com um mundo que não existe, e que é tão diferente desta realidade.

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