sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Politiquices

Hoje decidi quebrar uma das (ocultas) regras deste blog e falar sobre política. Embora seja muito mais interessante em conversa do que por escrito, mandar bitates é sempre engraçado e portanto vou deixar aqui uns quantos.

Neste momento os portuguese revelam-se indignados com as novas medidas de austeridade anunciadas pelo novo Governo. A indignação das pessoas é perfeitamente perceptível face à postura dos políticos portugueses. Quando estão no poder (descartando uma ou outra situação mais dúbia) esforçam-se for atinar as contas com medidas de austeridade e invocam o interesse nacional. O que faz sentido. Mas a oposição apenas diz (sempre) que nos estão a roubar, que querem matar o povo, ou a classe média, ou os professores, ou seja o que for que estão a cortar na altura (já que, estando na oposição, podem dizer o que lhes apetecer então aproveitam para dizer aquilo que dá votos). Depois muda o partido no poder e trocam simplesmente.

Se virmos os discursos do PS de agora parecem os do PSD de há uns meses atrás e vice-versa. Portanto claro, se estamos anos a ouvir X a dizer que Y é um cretino e um ladrão por estar a fazer cortes e quando o metemos no poder corta ainda mais é normal que se estranhe e custe a entranhar. Claro que era mais que óbvio que isto ia acontecer, e era bastante fácil filtrar a demagogia política de entre os discursos. Vem-me particularmente À cabeça o debate Sócrates-Coelho em que o actual PM insistiu repetidas vezes que a descida da TSU não precisava de ser compensada por outros factores. Agora diz que não o pode fazer (em números não desprezáveis vá) porque não o consegue compensar. Lá está, já era perfeitamente óbvio que aquilo era treta e é bom que as pessoas se vão habituando a filtrar e a pensar e procurar informação individualmente o máximo possível para se resguardarem desses casos. E também é importante perceber que nem Sócrates era uma espécie de demónio satânico que nos queria roubar o dinheiro todo nem Passos Coelho é algo anjo enviado para nos salvar. Ambos são somente homens e acredito que, regra geral, ambos tentaram/tentam fazer aquilo que julgam melhor para o país.

Essa diferença entre o dito e o feito a que vulgarmente se chama politiques é consequência directa da democracia, só se vai para o poder se votarem em nós e os votos ganham-se com palavras. E não digo isto num sentido de critíca negativa. Imaginemos uma situação hipotética em que somos uma espécie de Deus, isto é, somos dotados da verdade absoluta e sabemos exactamente que medidas tomar para salvar/melhorar o estado do país. Mas também sabemos que, se as anunciarmos, nunca chegaremos a ter os votos que precisamos para as implementar. Não seria nosso dever moral mentir para obter os votos que nos permitiriam então chegar ao "bem maior"?

Claro que essa hipotética situação é, no mínimo, desviada da realidade e, vá, estúpida. Mas ilustra bem aquilo que quero dizer. Há uma linha que separa o patriotismo e a coragem da arrogância, desonestidade e obstinação. Mas não é uma linha toda colorida como as da ZON, é bem cinzenta e por vezes difícil de discernir. Há falta de confiança nos políticos em Portugal? Sim, certamente. Essa falta de confiança tem razões de ser? Sim também provavelmente. Essa desconfiança é exagerada? Sem dúvida. Há, a meu ver, também muita incompreensão da classe política e com os seus difíceis dilemas. Não é fácil lutar contra repetidas reinvidicações irrealistas da oposição, dos sindicatos e, por vezes, do próprio povo. E não é fácil gerir um país só por si. Existe corrupção? Certamente que sim. Mas a (incomparavelmente) maior parte dos nossos problemas não vem daí mas sim da repetida má gestão que temos tido temos o início da 2ª República. Desde 1974 que não tivémos um único (1!!!!) ano sem défice. Nem um único ano com execução orçamental positiva. E contam-se pelos dedos de uma mão os anos em que este foi menor que 3% . Para melhor ver e compreender este e outros problemas crónicos do nosso país aconselho todos os leitores interessados a lerem o livro do nosso actual ministro da economia, Portugal na Hora da Verdade (até porque é interessante ver algumas diferenças entre o que apregoava no livro e o que se está a fazer agora).

Outra questão interessante de analisar é a da forma de corrupção mais comum, isto é, o compadrio. Todos nos revoltamos contra as situações em que são atribuídos cargos importantes e bem remunerados a pessoas pela sua afiliação política e/ou ligaçãos de amizade/família. Mas ninguém se queixa do empregado da MacDonald's que não regista o hamburguer que oferece ao seu amigo. Ninguém se queixa do amigo que atende o amigo da vizinha que está doente sem consulta marcada, passando à frente de todos os que já lá estavam à espera. pelo contrário, será mal visto pelos vizinhos e amigos e familiares se se recusar a fazer estes "favores". Que mais não são do que a mesma forma de corrupção. Apenas se altera o cargo, e portanto a amplitude dos favores que conseguem fazer. Não quero com isto sugerir que se prendam estas pessoas ou se desculpem as outras. Apenas acho que é bom avaliar tudo de uma perspectiva mais geral e imparcial, de modo às nossas críticas não perderem o seu valor.

E pronto, em pouco mais de 10 minutos já deu para encher isto tudo, o que só prova a facilidade com que se mandam bitates de política neste país. Aproveitem que o tema não volta a entrar aqui tão cedo.


Filipe Baptista de Morais

1 comentário:

  1. Já agora aproveito ainda para fazer mais dois reparos.

    O primeiro relativamente à nossa recente e contínua crítica/postura em relação à União Europeia. Não nos podem exigir que mudemos tanto de um momento para o outro, têm que nos dar mais tempo para pagar as dívidas, blá, blá. Então e no caso da Madeira? Aí não temos que dar tempo nenhum, já que são uns sacaninhas que esbanjam o nosso dinheiro a gastar mais do que deviam e isso assim não pode ser. Não seremos nós a ser vistos apenas como uma Madeira da Europa, e não serão as reacções/exigências muito semelhantes?

    Para terminar, no outro dia vi uma comentadora política (a do Eixo do Mal, cujo nome desconheço) dizer que austeridade é precisamente o oposto do que o país precisa neste momento. Ora, como não há dinheiro e estamos enterrados em dívida, certamente que poupar dinheiro não é solução pode vai contrair a economia, devemos é injectar mais dinheiro na economia para ela crescer. Faz sentido, afinal toda a gente sabe que dinheiro gera dinheiro. Alguém repara no pequeno senão? Vou repetir apenas as partes mais interessantes: "Ora, como não há dinheiro (...) devemos é injectar mais dinheiro na economia". Oh yeah. Vamos injectar o dinheiro que não temos e ainda por cima estamos a dever. Como é que ninguém pensou nisto antes?

    (O autor, que não consegue assinar devidamente devido a um bug qualquer do google)

    ResponderEliminar